segunda-feira, 26 de janeiro de 2015
quarta-feira, 14 de janeiro de 2015
Estupidez e cobardia juntas resultam numa mistura mais do que porca
«O "Spider Pig", dos
Simpsons, também não pode aparecer nas publicações»
Transcrevendo o que aqui se pode ler:
«A Oxford University Press, uma
das maiores editoras do mundo, começou a avisar os autores de livros escolares
para banirem a palavra “porco” ou qualquer referência ao animal, como por
exemplo salsichas. O objetivo é não ofender judeus e muçulmanos, já que para
ambas as religiões o porco é considerado um animal impuro.
A revelação foi feita pelo jornalista Jim Naughtie na
BBC, durante uma discussão sobre a liberdade de expressão, na sequência do
ataque ao Charlie Hebdo, em Paris. Casado com a escritora Eleanor Updale,
Jim Naughtie contou que
a Oxford University Press enviou uma carta aos autores de livros infantis com
algumas diretrizes, entre as quais a proibição de usar a palavra “porcos”, ou
outras referências que façam alusão ao animal.
“Bem, se uma
editora respeitável ligada a uma instituição académica [Universidade de Oxford]
está a dizer que temos de escrever um livro sem que possamos mencionar porcos
porque algumas pessoas podem ofender-se, é simplesmente ridículo. É uma piada”,
disse Jim Naughtie.
O deputado muçulmano do Partido Trabalhista do Reino
Unido, Khalid Mahmood, mostrou-se contra a orientação. “Discordo em
absoluto. É um perfeito disparate. E quando as pessoas vão longe demais,
toda a discussão cai em descrédito”, disse ao Daily Mail. O líder do
Conselho de Liderança Judaica também reagiu: “As leis judaicas proíbem comer
porco, não a menção da palavra, ou o animal do qual deriva”, disse um
porta-voz.
A Oxford University Press reagiu através de um
curto comunicado.
“Os nossos materiais são vendidos em quase 200 países e, como tal, sem
comprometer de forma alguma o nosso compromisso, encorajamos alguns autores de
materiais educativos a considerar de forma respeitosa as diferenças culturais e
as sensibilidades”. E acrescentam: “As orientações para os nossos
materiais educativos diferem entre regiões geográficas e não cobrem as nossas
publicações académicas”.
Se a medida se mantiver, as crianças que lerem os livros
da editora britânica vão ficar sem saber quem é a “Miss Piggy” ou “Os
Três Porquinhos”, nem vão saber o que são salsichas ou costeletas.»
O que, digo eu, remete afinal para o que aqui já foi dito.
O que, digo eu, remete afinal para o que aqui já foi dito.
terça-feira, 13 de janeiro de 2015
segunda-feira, 12 de janeiro de 2015
E diz ela assim:
O
problema não são os outros. Somos nós.
Por Helena Matos (no Observador)
Como é que a Europa deve responder aos ataques terroristas?
A solução passa sobretudo por medidas securitárias, ou deve passar também pelo
combate ao desemprego e pela integração das comunidades árabes e islâmicas? São
preocupantes os sinais que apontam para o crescimento da xenofobia?” – No site
da TSF estas perguntas lançavam o Forum da passada sexta-feira.
O primeiro impulso seria rir perante o óbvio destrambelho destas
perguntas: combate ao desemprego? Mas desemprego de quem? Onde é que na Europa
alguma vez o terrorismo foi praticado por pobres ou por desempregados? Os
terroristas europeus contaram nas suas fileiras com aristocratas, militares,
jornalistas, padres, artistas, estudantes, intelectuais, médicos… Agora que se
mata em nome de Alá e não de Marx as profissões são menos diferenciadas. Não
temos em 2015 registo de nenhum terrorista que seja editor e aristocrata como
foi nos anos 70 do século passado Giangiacomo Feltrinelli nascido em palácio,
responsável pelas melhores edições de Itália e bombista que se dizia serviço do
proletariado, mas daí a ver-se nos autores dos recentes atentados em França uns
jovens que o desemprego e a falta de oportunidades levam a matar os seus
semelhantes vai um pedaço de mau folhetim neo-realista que nenhuma realidade
sustenta.
E o que se entenderá por “integração das comunidades árabes e
islâmicas”? Aliás será que ser árabe ou islâmico faz de cada um automaticamente
membro dessas ditas comunidades? Os portugueses que emigraram para França há
tantos anos quanto os pais de muitos destes membros das actuais “comunidades
árabes e islâmicas” e que ao contrário de muitos deles nem sequer sabiam ler
nem escrever e muito menos falar francês que medidas tiveram para promover a
sua integração na sociedade francesa?
As perguntas lançadas no Fórum da TSF são semelhantes a tantas
outras formuladas nos últimos dias. São perguntas, frases e comentários que
partem sempre do mesmo princípio: o problema da violência dos outros somos nós.
Porque nós vemo-nos como responsáveis por tudo o que aconteceu e acontece no
mundo: para tudo aquilo que os outros fazem há sempre um gesto ou uma decisão que
nós ou os nossos antepassados tomámos agora ou há quinhentos anos e que
explicam, justificam e de certa forma têm desculpado aos nossos olhos o
terrorismo e os terroristas.
Nós, europeus, temos um problema sério. Não com os terroristas
que por mais chocante que seja escrevê-lo nestes dias não é a nós, ocidentais,
que causam maior dor: enquanto na Europa se repetia “Todos somos Charlie”, na
Nigéria o Boko Haram matava 2000 pessoas, na sua maioria mulheres, crianças e
velhos sem que alguém se indignasse ou sequer admirasse. Não há semana em que
na Nigéria, no Paquistão ou no Quénia o terrorismo islâmico não faça atentados.
Meninas de dez anos são transformadas em bombistas suicidas. Das vítimas
ninguém sabe nada, nem a idade, nem o nome nem o que faziam.
Ao contrário do que sucede nesses países, o terrorismo islâmico
não põe em causa o nosso modo de vida. Muito menos os seus autores têm
actualmente capacidade para condicionar a nossa vida política como o fizeram no
passado. Pense-se apenas que em 1978 as Brigadas Vermelhas tiveram capacidade
para manter Aldo Moro sequestrado durante 55 dias! O que presentemente o
terrorismo consegue é confrontar-nos com um mundo que não é apenas os
resultados dos nossos actos. E para esse ruir das nossas ilusões não estamos preparados.
O nosso problema com o terrorismo não são os terroristas mas sim
o relativismo com que analisamos os seus actos. E quanto mais esses actos nos
parecem plausíveis de ser explicados pela cartilha do sociolês mediático (uma
espécie de marxismo caldeado com fartura e culpa cristã por viver bem) mais os
toleramos. Daí que a condenação que fazemos do terrorismo seja quase indexada
ao posicionamento político das vítimas: durante anos e anos a ETA foi tolerada
porque as suas vítimas eram geralmente militares, agentes da Guarda Civil,
militantes do PP, empresários… enfim gente que nesse discurso justificativo se
procurava sempre associar ao franquismo. Quando se tornou óbvio que as balas da
ETA não distinguiam as nucas da gente de esquerda das da gente de direita era
como se se estivesse perante um desacerto desses rapazes um pouco excitados mas
apesar de tudo gente de causas. E só nessa fase em que ser de esquerda deixou
de ser um escudo perante a ETA muito boa imprensa tida como de referência
deixou de tratar a ETA como movimento independentista para passar a designá-la
como aquilo que sempre foi: terrorista.
Pelo contrário não houve qualquer simpatia, enquadramento
socio-cultural ou tentativa de compreensão das razões que levaram Anders
Behring Breivik a matar vários dos seus concidadãos na ilha de Utøya. Breivik
era branco e de olhos azuis, não podia ser integrado em comunidade alguma e era
de extrema-direita. Logo foi visto como aquilo que era: um terrorista e não o
resultado de uma qualquer exclusão. Aliás se os irmãos Kouachi tivessem levado
a sua mortandade a cabo não no “Charlie Hebdo” mas sim num jornal de direita
não faltariam neste momento explicações para os seus gestos.
Por exemplo explicações similares às que foram dadas em 2005
aquando do assassinato por um fundamentalista islâmico do cineasta Theo Van
Gogh, ele mesmo, a vítima, definida como um “provocador”. Ou aquando dos
atentados do 11 de Setembro em que a culpa era inevitavelmente de Bush, dos
americanos que “estavam a pedi-las” e das torres que eram um símbolo do poderio
capitalista. Explicações similares às dadas quando o jornal dinamarquês
“Jyllands-Posten” publicou várias caricaturas de Maomé: condenou-se rapidamente
a violência para logo em seguida se partir para o perfil “populista” da publicação
e, em seguida, desenvolver longos raciocínios sobre a problemática da
intolerância. Não, como em abstracto se esperaria, da intolerância dos
agressores mas sim daquela que em nome das vítimas poderia vir a ser
desenvolvida…
Os exemplos não faltam. Nem vão continuar a faltar. Embora se
possa ser levado a pensar que o agora sucedido em França virá a marcar um antes
e um depois na forma de olhar estas questões na Europa. A própria forma como a
sociedade francesa está a reagir dá conta de algo que vem de muito antes e que
não se restringe ao fundamentalismo islâmico: estamos perante um país que
perdeu para a Inglaterra o lugar de quinta economia mundial e em que o ministro
da Economia, Macron, teve de se explicar porque declarou que era positivo que os
jovens franceses desejassem ser milionários. Um país onde grupos de jovens
assaltantes conseguem bloquear comboios, assaltar os seus passageiros (às vezes
seleccionando nestes e noutros ataques as vítimas pela sua aparência racial) e
ainda atacar as equipas de socorro.
Um país que precisamente dias antes destes atentados viu com
estupefacção serem publicadas fotografias tiradas dentro de prisões francesas:
a avaliar por aquilo que ali se via de consumos de drogas e ostentação de
dinheiro algumas prisões francesas são um espaço cujo ambiente parece retirado
de um qualquer festivo e sórdido casino. Se se recuar uns meses e se se
trocarem estas fotos pelos parágrafos de um relatório policial constatar-se-á
que, segundo os autores desse estudo, as prisões francesas são um dos
principais locais de radicalização dos jovens muçulmanos pois não existe
qualquer capacidade de controlar a actividade dos imans nos estabelecimentos
prisionais. Como não podia deixar de ser rapidamente se esqueceram os avisos
contidos nesse relatório para mediática e politicamente o tomar como pretexto
para um tema bem mais aliciante e politicamente correcto: correm as prisões
francesas o risco de se transformar num novo Guantanamo?
A França é o país onde todas as semanas aparece o problema de
uma funcionária de supermercado ou escola que pretende trabalhar de rosto
completamente tapado mas onde paralelamente as activíssimas associações ditas
de livre pensamento, que se calam respeitosamente perante a actividade dos
fundamentalistas islâmicos, exigem com urgência que se proíbam os presépios nos
espaços públicos. O país onde as autoridades se regozijaram porque na noite da
passagem de ano foram incendiados apenas 940 automóveis: afinal em 2014 tinham
sido contabilizadas 1 067 viaturas queimadas. (Já agora quantas notícias se
leram sobre estes factos na imprensa portuguesa? Será que os jornalistas não
sabem francês ou simplesmente não estão preparados para dar notícias que não
cabem na sua quadratura do mundo?)
Um país onde abordar boa parte das questões que vão do mundo do
trabalho, à habitação e às escolas se torna num campo minado em que em vez de
se discutirem os problemas concretos logo se define que colocar determinada
questão é discriminatório, passando com fervor a discutir-se se A ou B é
xenófobo. Patrões, professores e funcionários estão entregues a si mesmos
perante uma minoria que escudada nos conceitos de comunidade exige de facto um
tratamento diferenciado para impor a sua vontade aos demais e retirar as
maiores vantagens do sistema (não estou a falar apenas dos radicais muçulmanos
mas também deles).
Mesmo umas prosaicas salsichas numa festa de escola infantil
podem tornar-se em França no pretexto para que algumas famílias, alegando que
não comem carne de porco, não só tenham direito, como é desejável, a uma comida
diferente, mas acabem a impor as suas regras a todos demais. Pois face à recusa
destas famílias de partilharem um grelhador onde tivessem estado carnes que
consideram impuras, a alguns professores não ocorreu melhor ideia que acabar a
só servir salsichas halal. Ou seja salsichas confeccionadas com animais
abatidos segundo os ritos da religião muçulmana. Naturalmente esta decisão foi
tomada e justificada em nome da tolerância
Com aquela espécie de complexo napoleónico de quem já teve um
imperador e agora tem presidentes em declínio, a França adoptou perante os seus
problemas a mesma atitude que tem perante a crescente influência do mundo
anglo-saxónico: fala de excepções culturais, usa a retórica da “grandeur” e
apresenta contabilidades engenhosas para iludir a realidade. O resultado é
catastrófico. Na rua a realidade impõe-se. E na política, o país que prefere as
revoluções às reformas e que acha que o mundo em geral e a França em particular
se ordenam por declarações de vontade prepara-se para mais uma vez tentar
suster a evolução da economia e da História. Agora premiando eleitoralmente os
radicais de direita. De quem esperam exactamente o mesmo que esperaram quando a
esquerda elegeu Hollande: que façam leis que garantam à França um estatuto
excepcional no mundo e que portas adentro os consigam tirar desse inferno de
intolerância a que em nome da tolerância chegaram.
sexta-feira, 9 de janeiro de 2015
"Morrer de pé em Paris"
Por Rui Ramos (no Observador)
Charb,
Cabu, Tignous, Wolinski e os seus colegas da Charlie Hebdo nunca aceitaram
limites. Eram “anarcas” de antes do politicamente correcto, que nem ao bom
gosto faziam concessões. Podiam-se ter ficado pelos presidentes franceses, pela
extrema-direita local ou pelo papa – alvos relativamente pachorrentos. Mas não.
Tiveram de gozar o Islão e os seus jihadistas, porque, como explicou Charb,
para ele, Deus não existia e Maomé não era, obviamente, o seu profeta.
Acabaram, por isso, a desenhar sob protecção policial – uma suprema ironia:
Maio de 68 defendido pelos gendarmes. No fim, nada lhes valeu.
O atentado, como alguns
disseram, era previsível. E a nossa reacção também. Fomos Charlie, como em
tempos fomos americanos. Desfraldámos, mais uma vez, os grandes estandartes da
“liberdade” e da “união”. Nesta aparente unanimidade, houve algo de
reconfortante, mas talvez também algo de enganador: a sensação de que, no
fundo, a vitória é certa, porque a razão, a história e outras grandes
abstracções lutam por nós. Os terroristas estariam de antemão derrotados e a
barbárie, por mais sangrenta, seria sempre algo de fútil.
A ideia de que o mal, só
por ser o mal, está destinado a perder é uma crença religiosa que o
progressismo secularizou e perfilhou. No entanto, nem sempre ajuda a
compreender as coisas, especialmente na sua versão laica, muito mais automática
e simplória: o facto é que o terror faz sentido e é eficaz. Lembremo-nos do 11
de Setembro. Para começar, destruiu o à-vontade com que tínhamos passado a
viver no Ocidente depois do fim da Guerra Fria. Depois, empurrou os EUA para
intervenções na Ásia, dividiu as potências ocidentais, e sobretudo isolou a
população islâmica no Ocidente.
Alguém se lembra de
“islamofobia” antes de 2001? Era quase preciso recuar à Idade Média. Na década
de 1990, só Samuel Huntington via na civilização islâmica um desafio. Todos os seus colegas
politólogos andavam muito ocupados com a suposta ameaça dos “nacionalismos”.
Depois de 2001, a história passou a ser outra. Foi então que os movimentos
anti-imigração na Europa se expandiram decisivamente, depois de uma xenofobia
já mais ou menos desacreditada ter sido reforçada pela desconfiança em relação
ao Islão fomentada pelo jihadismo. As novas “manifestações de segunda-feira” na Alemanha ainda por
enquanto encontram contraditores. Mas se as carnificinas jihadistas alastrarem,
quantos mais europeus vão sentir que só as fronteiras fechadas e o nativismo de
Marine Le Pen os poderão defender?
O alvo do terror
jihadista no Ocidente são, na verdade, as comunidades muçulmanas e a
possibilidade de estas viverem a sua fé de outra maneira que não em estado de
furor inquisitorial. O polícia assassinado na rua a seguir ao ataque à revista
chamava-se Ahmed Merabet. Na redacção, morreu um revisor de provas com o nome
de Mustapha Ourrad. Eram muçulmanos, como aliás todos aqueles que os jihadistas
matam regularmente às dezenas e às centenas no Médio Oriente, no Afeganistão e
no Paquistão. No Ocidente, o objectivo dos jihadista não é zelar pelo Islão, é
comprometer os muçulmanos, é impedir a sua integração nas democracias, é
estigmatizar o Islão, é reduzi-lo, aos olhos de todos, a uma simples plataforma
de terror.
Não estamos perante uma
lógica exótica. Conhecemo-la dos terrorismos da extrema-esquerda europeia da
década de 1970. A tese era que não havia diferença entre a democracia
representativa e a ditadura fascista: ambas eram organizações de classe para oprimir
o proletariado. A violência dos guevaras de subúrbio estava calculada para
provocar a violência do Estado democrático, de modo a que este revelasse a sua
verdadeira natureza de ditadura de classe. O proletariado seria assim levado a
optar pelo confronto violento. Os jihadistas, com o seu terror, contam pôr o
Estado democrático e a diáspora muçulmana na mesma situação de tensão e
conflito.
Tudo isto pode limitar
as nossas liberdades, mas convém perceber como. Pode limitá-las se tivermos de
começar a desenhar e a escrever protegidos pela polícia. Quantos vão preferir
morrer de pé, como Charb morreu em Paris? Mas o terrorismo afectará as nossas
liberdades sobretudo se os jihadistas conseguirem adquirir um ascendente sobre
as populações muçulmanas que seja suficiente para obrigar as autoridades
ocidentais a tratá-las globalmente como um risco de segurança. As nossas
democracias estariam perante um dilema: como é que um país pode ser
verdadeiramente livre se precisar de manter uma percentagem importante da sua
população – no caso da França, 7,5% dos seus residentes em 2010 eram
muçulmanos — sob suspeita e vigilância? É nisso que os
jihadistas apostam, e é uma aposta que não devemos subestimar.
Neste momento, só há uma
maneira de conter a “islamofobia”: é derrotar o jihadismo, e para derrotar o
jihadismo vai ser preciso mais do que um hashtag de bons sentimentos.
quinta-feira, 8 de janeiro de 2015
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