segunda-feira, 30 de julho de 2012

Das devidas ilações à portuguesa


Foto obtida aqui

António Costa disse, em entrevista a Judite de Sousa, que não teria competência para ser guarda-redes do Benfica, mas que teria as suficientes para ser secretário-geral do PS.

Estaria ele a criticar subtilmente Jorge Jesus? Ou a direcção do Benfica? Ou a minimizar as competências exigidas à liderança do seu partido? Ou a dar a entender que os socialistas devem adoptar uma táctica defensiva? Ou o Benfica?

Olha, que se lixe!

domingo, 29 de julho de 2012

Dá-lhe lume

Anthony Watts acaba de publicar um trabalho relativamente à história dos sensores aquecidos.


Albino Almeida, o PPP


Escola Secundária Sebastião e Silva

Retoiçava eu cerca de uma semana atrás, mais ou menos distraído, pela relva noticiosa da TVI24, quando, subitamente, as palavras do tratador, perdão, do pivot comunicador (ou ao contrário) zuniram com a força de um raio que me houvesse atingido os tímpanos, deixando-me em vertiginoso estado de desequilíbrio momentâneo. Num esforço quase sobre-humano, consegui, porém, retomar a presença de espírito necessária para perceber o que me acometera e dar-me conta das evoluções do fenómeno.

A força do que quase me derrubara provinha do inesperado do seu carácter: num qualquer concelho, cujo nome o choque me fez esquecer, autarquia, sindicatos de professores e associações de pais concordaram em que a extinção, decretada pelo ME, de onze (onze!) escolas era benéfico para as crianças, as quais passarão agora a frequentar uma outra, a estrear, maior e com melhores condições. Nem vestígios de bullying político, sindical ou outro. Harmónico consenso e tal.

Quase pensei ter acordado senão no céu pelo menos noutro país. Era bom demais e os (suponho eu) igualmente desorientados jornalistas deverão ter pensado o mesmo mas na perspectiva oposta, a do “ai!, que lá se vai o nosso negócio!, ai!, que querem dar cabo do nosso lindo Portugal!”. Pelo que terão ido a correr, em meio de atarantados tropeções, na direcção do telefone, ligar ao sr. presidente da CONFAP, o dr. Albino Almeida, que nunca lhes falhou com o sustento da indispensável tirada crítica.



Foto obtida aqui

Quando o presidente de todos os papás de Portugal entrou no ar, já eu me refizera o suficiente para o ouvir com uma atenção que se foi transformando em espanto: é que o PPP (presidente de  - todos -  os papás portugueses) nada tinha a dizer quanto ao fenómeno em si mesmo! Mas de Albino Almeida ainda o país terá muito a esperar, sem que sequer precise de gerar regularmente cidadãos pela vida fora ou sequer de os adoptar, para, deste modo, manter o estatuto que lhe permitiu alcandorar-se à nobre missão a que há anos se dedica. Pelo que não surpreenderá que, em quem o ouviu, haja ido diminuindo gradualmente o espanto, substituído uma vez mais pela admiração face à adequada, justa e subtil argumentação que desenvolveu perante os aplaudentes e reconhecidos profissionais da notícia.


Foto obtida aqui

Não se referindo, pois, ao assunto, frisou, todavia, Albino, algo que é vital ter em conta: se estas novas escolas foram construídas para resolver o problema do isolamento dos alunos que a diminuição da taxa de natalidade provocou nos pequenos agregados populacionais e, em simultâneo, proporcionar-lhes melhores condições de aprendizagem, o acentuar dessa diminuição fará, a médio prazo, que igual problema se ponha quanto às que agora se inauguram. E que é indispensável começar, desde já, a encarar frontalmente o problema e prover, na medida do possível, às suas consequências. Porque isto vai ser um “grave problema para o ensino” em Portugal.

Fiquei a matutar no significado profundo das palavras do PPP. A justeza do que apontou é indesmentível, a verificar-se a continuidade da tendência para a diminuição da natalidade. Não me parecia, no entanto, que isso pudesse vir a constituir um problema para o ensino e para a educação em si mesmos, a não ser que se considere como tal a redução do número de professores necessários para essa tarefa. Até porque, por outro lado, tal permitirá, tanto a alunos como a professores, usufruir de um maior espaço disponível para libertar e multiplicar e desenvolver as suas eventuais capacidades criativas e de investigação.

Lembrei-me, aliás, das escolas do regime do ditador Salazar da minha infância. O Liceu Nacional de Oeiras, por exemplo, a actual E. S. Sebastião e Silva, única escola secundária pública existente, até 1969, entre Algés e Cascais, foi construída para ser frequentada por 500 alunos. Disseram-me que, na década de 80, chegou a ser de 3000 a sua população escolar, e que, dadas as suas dimensões e estruturas, o ME terá mesmo pensado em instalar ali uma Faculdade. Imagine-se o potencial que, hoje, essa mesma escola não representaria para os alunos, em número para o qual foi originalmente planeada, num país livre e que promovesse um verdadeiro ensino.


Foto obtida aqui

Voltando, pois, àquilo que me motivou a escrever estas linhas de fim-de-semana. Posta de parte, por absurda e indigna do brilho da sua mente, a interpretação literal das palavras do dr. Albino Almeida (a não ser no caso de um oportuno, mas para todos impensável, mano-a-mano pontual com Mário Nogueira) apenas me restava supor nelas a existência de um outro significado, de carácter mais profundo e, como já disse, subtilmente enunciado. E foi então que o génio de Freud irrompeu na minha mente, não para que aplicasse os meus parcos conhecimentos de psicopatologia ao Querido Líder da paternidade lusa, mas antes a mim próprio. Porque, sem aparente razão plausível, irrompeu na minha zona de consciência uma frase de Tony Blair em simultâneo com uma outra, que se podia ver a cada passo em cartazes governamentais, nos anos 80 e 90. Passo a explicar.

Nenhum país  - Portugal, nesta fase da sua História, muito menos -  poderia prescindir de um cidadão com a envergadura intelectual e o dinamismo de Albino Almeida. O seu estofo levá-lo-á, quase inevitavelmente, a assumir, mais tarde ou mais cedo, um cargo governativo onde possa desenvolver uma acção decisiva para o sucesso do nosso destino colectivo. E o dr. Almeida, dotado de imparável argúcia, já se terá disso apercebido há muito tempo: a nação anseia por alguém com uma visão como a sua. Sendo, contudo, o PPP  - como Cavaco Silva -  um homem simples, que utiliza uma estratégia chã e directa na abordagem dos problemas mais complexos, não poderia, nesse plano, afirmar-se e competir com os chamados políticos de carreira, que utilizam nos seus discursos uma linguagem quase sempre aproximativa e, com frequência, metafórica. Pelo que haveria que adoptá-la e adaptar-se-lhe.


 Foto obtida aqui

Esta intervenção de Albino Almeida terá, provavelmente, dado o sinal de partida para o seu futuro percurso político, com um grau de elegância equivalente à deslocação que o sr. Presidente da República fez, em 1985, à Figueira da Foz, para rodar o seu novo Citröen. Aproveitando uma das mais recentes manifestações de preocupação do Professor Doutor Cavaco com o Portugal do século XXI, o PPP reforçou-a e apelou indirectamente à nação para resolver o verdadeiro problema, o que se encontra na raiz mesma do das escolas abandonadas.

A única solução é, efectivamente, aumentar a taxa de natalidade ou, em linguagem popular, fazer filhos. Cavaco já disse aos seus concidadãos que é dever de todos gerá-los, que a Pátria precisa de meninos. Nisso se opõe a Tony Blair que incitava os ingleses a fazerem mais sexo oral. E foi também no decorrer dos governos de Cavaco Silva que houve um enorme incremento de incentivos ao FEDER, que em múltiplas obras se viam cartazes em que se podia constatar o apoio que o FEDER lhes dera. Freud, tal como o algodão, não me enganou nos seus caminhos ínvios.


Foto obtida aqui

O dr. Albino não o disse, porque seria pouco aconselhável ir assim directamente ao assunto. Mas terá assumido, em espírito, e exprimido, sugestivamente, essa linha traçada por aquele que poderá vir a ser, um dia, um seu antecessor  - afinal, em que é que o dr. Albino Almeida é menos do que o dr. Fernando Nobre para poder encabeçar qualquer candidatura de cidadania? Pois bem, eu declaro desde já a minha decisão de, nesse caso, lhe dar o meu voto. Nada me agradaria mais do inserir-me incondicionalmente na acção patriótica para que o seu discurso aponta, da qual sou um adepto entusiasta desde muito novo.

A minha única dúvida reside no mote da campanha que, para maior contundência, Albino Almeida deveria adoptar. Num tom assertivo, de comando, talvez

QUE SE FODA A NAÇÃO!

ou, tout-court,

FODA-SE!

Não sei, mas sei que ganhei aquele dia. É que se a espertalhice me enoja, a inteligência encanta-me.


Foto obtida aqui


Penso eu, pensas tu ...

No Fiel Inimigo:

Pois eu acho que o caro está substancialmente equivocado. Parece-me que devemos pensar no que os outros pensam de nós.

Repare, numa empresa não se faz (sentido lato) outra coisa que pensar naquilo que o cliente pensa da empresa e daquilo que ela faz.

Mas o equívoco dá pano para mangas. Hoje apenas se "pensa" naquilo que devemos pensar!!! Em boa verdade, exercita-se a auto-censura. "Não é assim que deves pensar" afirma com frequência o professor aos alunos. Em alternativa talvez "pensa como quiseres mas, quanto a mim, estás errado" ou "pensa lá o que quiseres mas a responsabilidade é tua".

Mais, hoje, o politicamente correcto insiste em estabelecer aquilo que os outros "devem pensar de nós". Não lhe basta aquilo que eles devem dizer de nós mas aquilo que eles devem pensar de nós.

Pois devemos pensar naquilo que os outros (estrangeiros ou não, outros países ou não) pensam de nós. Tarefa difícil, aliás, tanto mais que o politicamente correcto tende a ir ao encontro das linhas e não das entre-linhas.

Uma coisa é ainda certa: só podemos ter liberdade (novamente em sentido lato) de pôr em prática o que pensamos (de nós e/ou dos outros) se tivermos liberdade para o fazer e essa liberdade implica liberdade económica. Sem ela, dependeremos sempre mais daquilo que os outros pensam de nós do que nós pensamos deles ou de nós próprios. A liberdade 'é à borla' mas o exercício dela não é.

Olympicene - Periodic Table of Videos

À atenção de Mário Nogueira!


Vi, há pouco mais de uma hora, na TVI, uma reportagem sobre a aldeia de Bemposta, Penamacor, onde a população menor de 60 anos não ultrapassa as 20 pessoas e apenas existe uma criança, de 4 anos de idade.

A escola está fechada!

Os professores passaram do horário zero ao plantio de couves na Zona Pedagógica!

Professores, todos a Bemposta!

JÁ!

Watts Up With That?

Anthony Watts anuncia algo fora do comum para esta tarde (por volta das 8 da tarde em Portugal):

" Something’s happened. From now until Sunday July 29th, around Noon PST, WUWT will be suspending publishing. At that time, there will be a major announcement that I’m sure will attract a broad global interest due to its controversial and unprecedented nature."

Gronelândia, onde o mar é mais azul


Nos últimos dias, fomos literalmente assaltados pelo tremendismo da notícia de que 97% do gelo da Gronelândia tinha derretido em poucos dias.
Eu fiquei todo contente porque como Al Gore ( Uma Verdade Inconveniente), tinha dito que tal eventualidade produziria uma subida de 6 metros no nível do mar, teria a praia aqui mais perto.
Planeei até ir comprar uma toalha nova, uma prancha nova de bodyboard, etc. Até hoje, nada e, pelo que sei, em Lisboa o rio Tejo continua calmo  e sereno, a banhar o cais das colunas.

Uma chatice!
Ironias à partem, quem tem uma ideia mais sólida destes assuntos, facilmente conclui que o que derreteu foi uma camada superficial em 97% da superfície,  como acontece sempre na estação quente. Este ano, se calhar um pouco mais.
Esse é o facto.
Mas a percepção da generalidade das pessoas, induzida pelo modo como o facto foi comunicado, com imagens elaboradas e tudo, é que 97% do gelo da Gronelândia, derreteu.
Uns dirão que os jornalistas são burros, outros dirão que são activistas.
Eu penso que uns sabem tanto disto como de renda de bilros e que se limitam a cozinhar a notícia do modo mais sensacional possível, dizendo que o homem mordeu efectivamente o cão. Se não fosse assim, o facto existiria, mas não a notícia.
Outros, uma minoria, são de facto activistas em missão e tratam de usar jogos de palavras para moldar a notícia aos seus desígnios.
E conseguiram.
O que fica, para a generalidade das pessoas que dedicam ao assunto uns segundos de atenção, é que a Gronelândia está praticamente sem gelo que nós somos os culpados.
E, sendo culpados, estaremos mentalmente disponíveis para exorcizar a culpa, pagando mais umas taxas em acto de contrição.
A culpa é algo muito poderoso, que o digam as religiões, tanto as sagradas como as profanas.
E esta nova religião do planeta é imbatível, na questão da culpa.

Tony R. Clef : Core 'ngrato (Ungrateful Heart) (Neapolitan Song by Salvatore Cardillo)


"Core 'ngrato" (Ungrateful Heart aka "Catari")
Music by Salvatore Cardillo
One of the most famous of the Neapolitan songs recorded by every tenor you care to name. It was written in 1911 for Enrico Caruso (according to wikipedia). I took my version from a live recording here on youtube of Giuseppe di Stefano with piano.

My favorite recording of this is on Franco Corelli's album named simply enough "Franco Corelli sings Neapolitan Songs". The orchestrations on that album, by Franco Ferraris, are spectacular.

My arrangement. Learned by ear. I have nothing written down.
Taylor NS54-ce, hybrid classical
Drop-D tuning
D'addario Pro Arte normal tension nylon strings

sábado, 28 de julho de 2012

Nivaldo Cordeiro: À espera do mensalão


"Faltando poucos dias para o julgamento do mensalão vê-se que há uma grande expectativa no país pelo evento. A revista Veja que chegou às bancas deu capa ao tema, a expor a fotografia de José Dirceu, o chefe de toda a trama, junto com Lula. Eu considero que o País sairá vitorioso pelo simples fato de haver o julgamento, do qual não espero grandes condenações. Mas ele precisa haver, o que ainda não é inteiramente certo."

Política de Terra Queimada

The burning of Troy
Há alguns anos, tornou-se público na Dinamarca o plano da NATO em caso de tentativa de invasão Russa; segundo esse plano, alguns países, nomeadamente a Dinamarca, seriam “terra queimada”. Plano muito “lógico”, havia que defender o coração da Europa, portanto destruía-se a periferia para estabelecer uma terra de ninguém onde fosse mais fácil combater os russos e proteger os cidadãos do coração. Estranhamente, os Dinamarqueses não gostaram nada do plano.

A Europa, e não só, embarcou numa perigosa e desajustada teoria económica (de que falarei noutro texto), de uma particular escola. Em consequência, os grandes bancos europeus, nomeadamente o Barclay’s e o Deutshe, devem ter um buraco financeiro de dimensão apocalíptica. Isto pode parecer surpreendente mas não é, o buraco não é decorrente de “incompetência” ou “corrupção” mas a necessária consequência da referida teoria económica. Quanto maior o banco, maior o buraco.

Qual é a estratégia para resolver esta situação?

A mesma de sempre: sacrificar a periferia.

A política de “empobrecimento” não é para os funcionários públicos, ou para os portugueses empregados, é para toda a periferia europeia. Na verdade, o buraco central será tão grande que o “empobrecimento” é para toda a Europa à excepção da Alemanha e da Inglaterra. A ideia é sacar todo o dinheiro que seja possível sacar para tapar esse buraco. A política de empobrecimento é apenas um nome para uma política de terra queimada, que vai abranger toda a gente com atividade nos países envolvidos, ricos ou pobres.

A medida mais recente é recusar um mecanismo europeu de suporte aos depósitos bancários; isto é um convite aos depositantes para correrem para esses dois bancos, vistos como “sólidos”. Na verdade, é uma armadilha: um banco pequeno pode ser muito mais seguro do que um grande porque está muito menos envolvido nas práticas financeiras agora ditas de risco – basta que saiba gerir a bolha imobiliária com inteligência, o ponto frágil dos bancos pequenos.

(um banco cujo presidente atribui o seu mau momento à Constituição Portuguesa não dá garantias de uma gestão inteligente; um gestor para a crise tem de ter um entendimento oposto aos gestores que conduziram a ela e que agora só sabem encontrar culpados em todo o lado menos neles – ele é o Sócrates, ele é a Constituição, ele é...)

Até ao fim deste ano vamos decidir o nosso futuro. Por acção ou omissão.

Dos gajos que querem levar o nosso país à ruína


Ou dos malandros que deixaram de querer ser solidários com a pobre Europa do Sul.

Da cidadania incendiária e da revolução para totós



Foto retirada daqui


Aqui escreveu José Manuel Fernandes (via Blasfémias):


Anda por aí uma nova moda: devíamos ser como os espanhóis. Não no tikitaka futebolístico, mas na fúria das manifestações. Esta moda, que perpassa pela crónicas dos jornais e comentários das televisões, que influencia o tom dos noticiários e leva os saudosistas do PREC a suspirar, é apenas a versão estival da primaveril excitação com a Grécia, com os seus desacatos e com o seu Syriza. Há mesmo quem glorifique a “tradição de cidadania” dos espanhóis enquanto se enfurece com a suposta abulia dos portugueses.

Confesso que olho para Espanha (como antes olhei para a Grécia) e não consigo encontrar nela razões para esses entusiasmos. É “tradição de cidadania” uma greve de mineiros asturianos marcada por emboscadas em que homens mascarados disparavam morteiros improvisados contra os polícias que tentavam manter aberta uma auto-estrada? Será “tradição de cidadania” juntar-se à sua marcha em Madrid e provocar distúrbios de que resultaram dezenas de feridos, nenhum dos quais mineiro? Ou será antes que em Espanha se cruzam várias tendências muito perigosas – uma propensão para radicalizar posições, extremando campos, como se viu durante o Governo do PSOE e se vê agora com o Governo do PP; uma tradição política muito marcada pela violência, tanto à direita como à esquerda, uma violência que nunca deu descanso à democracia espanhola; uma realidade política inquinada pelas mentiras que se disseram durante a recente campanha eleitoral, que foi radicalmente diferente da nossa de há um ano atrás – e que nada é recomendável neste caldo de cultura? Que pensar, por exemplo, de um parlamento catalão que aprovou, nesta mesma semana em que a região autónoma se viu forçada a pedir um resgate ao governo central, uma proposta de soberania fiscal que terá como inevitável consequência diminuir as transferências dessa região, que é uma das mais ricas de Espanha, para as regiões mais pobres?



Foto retirada daqui


Há muita coisa onde nos inspirarmos em Espanha, mas não seguramente na sua forma extremada de fazer política. Sobretudo não é de copiar uma forma de gerir a crise que tem sido desastrosa, mistura de mentiras sobre a real dimensão dos problemas e bravatas sobre o orgulho espanhol. O triste espectáculo desta semana, com o Governo francês de Hollande e o italiano de Monti a tirarem o tapete ao seu parceiro espanhol, mostra até como já não é só em Berlim que o comportamento errático de Rajoy causa irritação e desespero.

O idílio de certos fazedores de opinião com tudo o que cheire a manifestação, idealmente desacato, está, de resto, a gerar um fenómeno que é mais uma construção mediática do que real: a multiplicação dos protestos e das vaias. Com excepção de duas ocorrências genuinamente espontâneas – a vaia ao Presidente da República em Guimarães depois das suas declarações sobre as pensões de reforma e a assobiadela a Miguel Relvas na abertura de uns jogos da CPLP -, a maior parte das manifestações de desagrado têm sido organizadas por sindicatos da CGTP, o mesmo é dizer pelas estruturas locais do PCP. Valem por isso o que valem: relativamente pouco. A não ser, claro, nas rádios e nas televisões, onde permitem sempre um bom “momento de reportagem”.




A vontade de transformar estes micro-eventos – que com o passar dos dias são cada vez mais não-notícias, por serem repetições do mesmo guião – em grandes acontecimentos decorre da enorme vontade em que se concretizem as múltiplas profecias sobre a “explosão social” que têm vindo a ser repetidas ao longo do último ano. Já se perdeu a conta às vezes que Mário Soares disse com ar sério que isto estava à beira da implosão, para não falar das previsões apocalípticas do bispo das Forças Armadas. Como nada ainda aconteceu, não há como fazer uma forcinha.




Até agora a maioria dos portugueses tem-se alheado destes protestos. Já várias vezes tentei explicar porquê, pois isso nada tem a ver com abulia ou défice de cidadania. Primeiro, muitos portugueses começaram por sentir na pele, mesmo antes do aumento do desemprego, mesmo antes da dieta do Estado, o custo dos excessos de consumo e de crédito. Perceberam em casa que teriam de mudar de hábitos quando o Estado ainda não tinha começado a fazê-lo. Depois, porque os portugueses votaram há pouco mais de um ano em partidos que prometeram cumprir o acordo com a troika, não nos que prometeram denunciá-lo ou renegociá-lo.

Tem sido deste crédito social e deste crédito político que tem vivido, em boa parte, o Governo de Passos Coelho. Mas as coisas podem estar a mudar, e não apenas porque há muita gente a querer ver os portugueses na rua.

Há duas regras em política que nunca devem ser esquecidas pelos governantes. A primeira foi formulada por Maquiavel: é melhor fazer todo o mal de uma só vez a fim de que, provado em menos tempo, pareça menos amargo. A segunda é atribuída a Salazar, mas muitos a poderiam ter postulado: em política, o que parece, é.

Passos Coelho tentou, reconheça-se, aplicar o melhor que pôde a primeira destas máximas. O OE de 2012 prova-o bem. Quando foi discutido não faltaram comentários, sobretudo à esquerda, sobre “as folgas” que este incluiria, e que seriam malfeitorias desnecessárias. Hoje, pela conjugação de vários factores – as dificuldades da execução orçamental, o acórdão do Tribunal Constitucional, a situação em Espanha e na Grécia -, parecemos estar face a uma situação em que novas dores terão de ser anunciadas. Ao contrário do que sucedeu até aqui, em que houve compreensão para aceitar percorrer um caminho tão difícil, novas medidas de austeridade – como novos impostos – serão muito mais difíceis de aceitar do que as do passado. E o pior é que o tempo gasto na concretização de algumas reformas – como a reorganização da rede hospitalar ou a extinção de tribunais – já foi demasiado, pelo que as resistências estão a enquistar. O terreno está hoje muito mais minado do que há alguns meses, e de pouco parece valer acenar com estudos: a lógica das reacções políticas é de que tudo são “cortes cegos”, mesmo quando são cortes racionais e necessários.



Foto retirada daqui


Mais complexa ainda é a falta de atenção que este Governo tem tido com os detalhes, com a necessidade de um rigor intransigente. Por exemplo: nunca um governo nomeou tão poucos boys, nunca houve tão drásticas alterações na forma de escolher quem é nomeado, mas mesmo assim cada erro cometido – e foram vários, inúteis e alguns deles graves – polarizou sempre todas as atenções. Já o escrevi várias vezes, repito-o agora: cada disparate desses custa mais em reputação que muitas das medidas duras e impopulares. Ao mesmo tempo, os múltiplos casos Relvas enfraqueceram mais o Governo do que o acórdão do Constitucional. E os atrasos no combate às rendas – mesmo admitindo-se que quem os critica, especialmente o PS, foi quem criou os regimes que agora se procura desmontar – minam qualquer tentativa de aumentar a contribuição dos cidadãos vulgares e pagantes de impostos. Há uma percepção de injustiça que é politicamente explosiva.



Imagem retirada daqui


O meu desejo para Agosto não é por isso que os portugueses exercitem os músculos para se tornarem mais espanhóis, antes que o Governo e o principal partido da oposição sejam capazes de perceber que as angústias crescentes de muitos cidadãos obrigam a mais cuidado, e a menos demagogia, na acção política. A maioria deve recordar-se que não basta ter razão e agir com boa vontade reformista, que tem de ouvir mais e falar mais, e o PS lembrar-se que tem de ser parte da solução também nos temas difíceis, como na definição da rede hospitalar ou de tribunais.

Ao contrário do que muitos dizem, o país não precisa de nenhuma “grande visão”, mas necessita de uma luz ao fundo do túnel.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

PASCOALINAS (1)




"Proibidos contratos de 12 meses nos ginásios"


O Tribunal da Relação de Lisboa considera que os clientes de Ginásios não têm obrigação de pagar uma fidelização de serviço por doze meses, especialmente quando esse período obrigatório não traz vantagens diretas para o cliente.
                                                                              in  Fórum Diário de Notícias

 Um dos comentários rezava como segue:

  Foi importante e sensata esta decisão. É desta forma que o até aqui muito pervertido Sistema Judicial se limpa pela positiva, assim agissem todos os magistrados - com prudente consciência. Caso contrário fica-se nas mãos destes...operadores.

  Outros também apostam nessa coisa das fidelizações: recentemente a Optimus, que aliás deixei, tentou obrigar-me a pagar 250 Eur com o pretexto de que me fizera um desconto de 10 eur em dois meses já, e isso "fidelizaria". Só me largaram quando apresentei queixa na DECO e ameacei queixar-me à Procuradoria.

 "Contratos" leoninos? Ora, ora...!

                                                                 André Gameiro

Das bíblicas estupidez e má-fé



Saltitando pelo qualitativo

Comentário que deixei no FaceBook de Ramiro Marques:


"A expressão que toda a gente entende é "neoliberal." É por isso que a uso."

O problema é que a expressão não se destina a ser aplicada no vácuo como as viagens intergalácticas. A expressão corresponde a uma falácia, corresponde a coisa nenhuma, corresponde a uma alavanca de conto de vigário. É apenas uma tentativa para transformar mais uma derrota do projecto socialista (neste caso por via fascista ou por esse vector) numa vitória de uma nova força, evidentemente não existente. A necessidade dessa nova força deriva da necessidade de evitar tornar bem claro que o que está a acontecer é apenas repetição de erros históricos anteriores.

Já agora, também não se pretende que essa "nova força" tenha derrotado o socialismo mas um outro voo intergaláctico chamado estado-social.

Indo ao fulcro, trata-se tão simplesmente da reedição da velha história do salto qualitativo.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Recebi por email...



("boneco" retirado daqui)


... este texto, como sendo de Luís Fernando Veríssimo. Divertiu-me o suficiente para achar que deveria publicá-lo, embora o último parágrafo me levante dúvidas quanto a eventuais alterações nele feitas por alguém que o haja reenviado, a começar pelo pormenor da ortografia do "respectivo".





O Brasil, as galinhas e a economia




 Pegaram o cara em flagrante roubando galinhas de um galinheiro e o levaram para a delegacia.



      D - Delegado

      L - Ladrão

      D - Que vida mansa, hein, vagabundo? Roubando galinha para ter o que comer sem precisar trabalhar. Vai para a cadeia!

      L - Não era para mim não. Era para vender.

      D - Pior, venda de artigo roubado. Concorrência desleal com o comércio estabelecido. Sem-vergonha!

      L - Mas eu vendia mais caro.

      D - Mais caro?

      L - Espalhei o boato que as galinhas do galinheiro eram bichadas e as minhas galinhas não. E que as do galinheiro botavam ovos brancos enquanto as minhas botavam ovos marrons.

      D - Mas eram as mesmas galinhas, safado.

      L - Os ovos das minhas eu pintava.

      D - Que grande pilantra... (mas já havia um certo respeito no tom do delegado...)

      D - Ainda bem que tu vai preso. Se o dono do galinheiro te pega...

      L - Já me pegou. Fiz um acerto com ele. Me comprometi a não espalhar mais boato sobre as galinhas dele, e ele se comprometeu a aumentar os preços dos produtos dele para ficarem iguais aos meus. Convidamos outros donos de galinheiros a entrar no nosso esquema. Formamos um oligopólio. Ou, no caso, um ovigopólio..

      D - E o que você faz com o lucro do seu negócio?

      L - Especulo com dólar. Invisto alguma coisa no tráfico de drogas. Comprei alguns deputados. Dois ou três ministros. Consegui exclusividade no suprimento de galinhas e ovos para programas de alimentação do governo e superfaturo os preços.

      O delegado mandou pedir um cafezinho para o preso e perguntou se a cadeira estava confortável, se ele não queria uma almofada. Depois perguntou:

      D - Doutor, não me leve a mal, mas com tudo isso, o senhor não está milionário?

      L - Trilionário. Sem contar o que eu sonego de Imposto de Renda e o que tenho depositado ilegalmente no exterior.

      D - E, com tudo isso, o senhor continua roubando galinhas?

      L - Às vezes. Sabe como é.

      D - Não sei não, Excelência. Me explique.

      L - É que, em todas essas minhas atividades, eu sinto falta de uma coisa. O risco, entende? Daquela sensação de perigo, de estar fazendo uma coisa proibida, da iminência do castigo. Só roubando galinhas eu me sinto realmente um ladrão, e isso é excitante. Como agora fui preso, finalmente vou para a cadeia. É uma experiência nova.

      D - O que é isso,  Excelência? O senhor não vai ser preso não.

      L - Mas fui pegado em flagrante pulando a cerca do galinheiro!

      D - Sim. Mas primário, e com esses antecedentes... e respectivas equivalências.... Prof. DOUTOR... preso ???... Nem pensar!!

quarta-feira, 25 de julho de 2012

UKIP Nigel Farage - Polish TV interview July 2012

Excepto na introdução, a entrevista decorre em inglês.

neo-liberais socialistas

[Par de comentários que deixei no FaceBook de Ramiro Marques:]

Muito embora alguns países da "europa" estejam a fazer umas tantas e tentar outras tantas coisas para desarmar o nó górdio, a parte de leão a desarmadilhar chama-se crescimento e nada acontecerá até que sejam implementadas reformas de desregulamentação de todos os campos. Bruxelas continua a regulamentar freneticamente convencida que está num qualquer oásis que transforma a regulamentação em comida.

Eu não sei se eles pensam acabar com a "europa" deixando chegar ao ponto em que declarando terem perdido a guerra com os "neo-liberais", se decidem ir cada um por seu caminho.

Por exemplo, já alguém ouviu alguém dizer que se a Grécia sair do Euro, se pode despincelar da regulamentação "europeia" para se poder desatarcar?

A "europa" é uma baleia moribunda e quer quem que se meta com ela solidariza-se em pestilência.


...

Reparem, aqui ao lado, na patetice de Hollande que quer agora carros verdes para resolver o encalacranso da indústria automóvel francesa. Será de o convidar a vir a Portugal ver os carregadores de baterias de automóveis eléctricos que o socretino governo instalou e fez os contribuintes pagar e que estão sem uso e a apodrecer ao sol?

terça-feira, 24 de julho de 2012

Da elite

A dr.ª Clara Ferreira Alves e a cultura. Uma pérola no excelente Malomil.
Se a moda pega ainda alguém se atreve a escrever O dr. sr. Daniel Oliveira e a intelectualidade.

O fenómeno de Oliveira do Hospital

Já levaram a extensão de saúde, já fecharam a escola primária, já levaram o posto da GNR, já fecharam a estação de correios, e nós não temos o direito de deixar essas pessoas ao abandono só porque vivem em aldeias e em freguesias com menos população, diz o aniversariante líder dos socialistas. Tudo coisas que o PS nunca fez: não fechou extensões de saúde, não encerrou escolas primárias, não levou postos da GNR e não fechou estações dos correios
Que António José Seguro consiga dizer estas tiradas demagógicas sem se rir já ninguém estranha, mas que haja gente completamente desmemoriada a bater-lhe palmas só pode ser um fenómeno de Oliveira do Hospital.

Nogueira & Albino, a mesma luta

Alguma vez em Portugal um ministro da Educação reuniu simultaneamente com sindicatos de professores, sindicatos de funcionários, sindicatos de inspetores, associações de pais e associações de diretores? Não há memória de uma coisa dessas, por isso aquilo que se passou hoje no ministério da Educação mais não foi do que uma coreografia destinada a desgastar Nuno Crato: Nogueira & Albino apareceram lado a lado para reunir com o ministro e o malvado não os recebeu.
A Fenprof e Confap andam agora ao mesmo, porque lá bem no fundo são farinha do mesmo saco. É completamente irrelevante aquilo que Albino fez aos professores no passado, desde que a Escola Socialista seja defendida.

"Neo-liberais"

Comentário que deixei no Facebook de Ramiro Marques:

A coisa funciona assim: o país endivida-se e o estado investe injectando dinheiro na economia: é uma vitória do estado-social (eufemismo para socialismo) e derrota dos tenebrosos neoliberais.

 O estado endivida-se para pagar salários e pensões que a economia não está em condições de garantir: é uma vitória do socialismo e uma derrota dos tenebrosos neoliberais.

Aos "especuladores" chega o aroma a esturro de dinheiro torrado e fecham a torneira: é um tenebroso ataque dos tenebrosos neoliberais.

 As empresas morrem de asfixia em impostos e regulamentação aplicados pelo socialismo e fecham ou saem (deslocalizam): e o buraco que fica resulta de um tenebroso ataque nos neoliberais.

Os "neoliberais" são a cinza do dinheiro torrado pelo socialismo. Fora isso, os neoliberais são como os gambozinos: fazem sentir a sua presença pelo facto de não estarem lá.

domingo, 22 de julho de 2012

Três crónicas exemplares...




... de Alberto Gonçalves, no Diário de Notícias, que achei por bem ilustrar com obras de Escher:





Imagine-se uma minoria cujos membros foram historicamente perseguidos a pretexto das suas preferências sexuais. Imagine-se que à discriminação activa se acrescentava com frequência as purgas, as prisões arbitrárias, os julgamentos sumários, a tortura e, não raras vezes, a morte. Imagine-se que, pela força da lei e do terror, os indivíduos em causa abandonaram os hábitos que os distinguiam ou passaram a praticá-los em segredo. Imagine-se que, assim subjugada ou dissimulada, essa minoria apesar de tudo resiste na América dos nossos dias. Imagine-se que uma parte da América dos nossos dias acha natural que, além de oprimir por via legislativa os comportamentos da minoria, se enxovalhe em público os comportamentos de que a dita minoria abdicou ou simula abdicar. Imagine-se que a parte da América em questão é, teórica e ironicamente, a mais progressista.

Imagine-se agora que nada disto depende da imaginação, que a minoria referida são os mórmons e que, graças à candidatura presidencial de Mitt Romney, gozar com a seita é preconceito indispensável aos activistas contra o preconceito. Recentemente, coube à comediante Wanda Sykes, conhecida pela série "Curb Your Enthusiasm" e pela absoluta falta de graça, parodiar a poligamia que Romney, ao que se sabe, nunca praticou. A sra. Sykes, preta e homossexual, achincalha as características e costumes que não possui, mas desconfio que não gostaria de ver as suas características e costumes achincalhados por outrem. A discriminação está apenas nos olhos de quem a vê - e de quem vota em Barack Obama, claro, os únicos habilitados a distinguir os estigmas pérfidos dos estigmas engraçados.

É também claro que a sra. Dykes, perdão, Sykes não passa de um mero exemplo. Quando não satirizam George W. Bush, o anterior presidente, incontáveis vedetas de Hollywood passaram a divertir-se com um presidente eventual. No presidente de facto é poucos se atrevem a tocar, sob pena de exílio nas franjas do sistema ou o puro desemprego, os castigos reservados pelos guardiães da tolerância àqueles que não toleram. Se a indústria do espectáculo é um sintoma desta América "racista", o sr. Obama, funcionário público simpático e talvez perigoso, é o seu símbolo maior. É discutível que Romney mereça chegar à Casa Branca. Por isto e por aquilo, é recomendável que o sr. Obama a deixe.






Em nome da "igualdade", o Tribunal Constitucional vetou a supressão dos subsídios de férias e Natal dos funcionários públicos (ainda que não tenha vetado, em nome do mesmo princípio, a média salarial do sector). Confrontado com isto, Pedro Passos Coelho percebeu num ápice a oportunidade de aplicar um imposto aos subsídios de quem trabalha no "privado". Valeu-nos, momentaneamente, a "troika": o chefe de missão local do FMI, por exemplo, explicou que as medidas "compensatórias" devem vir do lado da despesa e não da receita. Mas nem a "troika" nos vale, já que o Governo, como todos os governos, decidiu então reduzir a única despesa que não cessa de encolher: a nossa. Se não fica bem inventar novos impostos, espremem-se os velhos.

O truque, aliás habitual, chega tipicamente disfarçado de "combate à evasão fiscal". Desde tempos imemoriais, ou há cerca de uma década, que os governos da pátria combatem essa entidade maligna, sob o argumento de que se os contribuintes em falta pagarem o que devem, os contribuintes ordeiros pagarão menos. Você paga menos? Eu, que mantenho as minhas relações com o fisco num rigor próximo do masoquismo, não pago menos. Pelo contrário. Muito pelo contrário.

Em artigo no "Jornal de Negócios", Camilo Lourenço lembra o óbvio: quanto mais o Estado arrecada, mais gasta. Por diferentes palavras, a "justiça fiscal" não passa de propaganda, por definição destinada a enfeitar o abuso que constitui o modus operandi das quadrilhas, perdão, dos senhores que nos tutelam. É por isso que embora em teoria ofenda ver os representantes da hotelaria e restauração prometerem revoltar-se contra a anunciada obrigatoriedade da "facturinha", na prática a atitude consola.

No contexto actual, não existe nenhuma razão que legitime a transferência, até ao último cêntimo possível, do dinheiro ganho pelo proprietário de um café para um Estado calão e trapaceiro. Mesmo que o primeiro esbanje irresponsavelmente o que lhe pertence, o segundo arranjará sempre maneira de esbanjar pior o que retira aos outros. Chegámos assim ao ponto em que um Estado indigente é capaz de ser a única hipótese para termos um país remediado, na economia e na moral. Por azar, a hipótese é remota.






Curioso. Meio mundo tem uma opinião sobre os privilégios académicos de Miguel Relvas, mas quase ninguém menciona o fundamento desses privilégios. E nem é necessário grande capacidade dedutiva. O "dr." Relvas é maçon, variante Grande Loja do Oriente Lusitano. O presidente da Lusófona também é maçon, e também membro da mesma "loja". Em 2006, ano da matrícula do "dr." Relvas naquela universidade, ambos já eram "irmãos" na sociedade que se desejaria secreta.

Percebe-se o secretismo: fica bem a um homem adulto o pudor em revelar que, nas horas livres, gosta de vestir aventais e cair na brincadeira. Mas perceber não é sinónimo de aceitar. O "caso" Relvas, explorado até à exaustão devido à antipatia natural que o protagonista suscita e, palpita-me, à respectiva área ideológica, é apenas um fragmento de um "caso" muito mais vasto chamado maçonaria.

Não pretendo dizer que a maçonaria é tema ausente do noticiário caseiro. De vez em quando, o bando obtém honras de manchete e debate graças a um pequeno escândalo, conforme há meia dúzia de meses aconteceu com a divulgação de segredos de Estado numa história que envolvia o entretanto lendário Jorge Silva Carvalho, ex-director do SIED, sócio da "loja" Mozart e - o mundo é pequeno - correspondente por sms do "dr." Relvas.

O problema é que, à semelhança de inúmeras desgraças pátrias, a maçonaria ocasionalmente irrompe em força nos "media", fomenta discussões apaixonadas, produz gritos indignados e, após uns dias em que se jura que nada voltará ao que era, tudo permanece intacto. E "tudo" não é força de expressão: as personagens, os cargos, as trocas, os favores, os interesses, as ilicitudes, as trafulhices, etc. Quem acha que o país está óptimo como está deve dar os parabéns à maçonaria, que em larga medida os merece. Quem acha o contrário, deve dar à maçonaria outra coisa qualquer. Talvez uma ordem de despejo.

Não sou apreciador de proibições. Porém, não faltam por aí entusiastas. Do sal ao açúcar, do tabaco às emissões de dióxido de carbono ataca-se diária e galhardamente as chagas sociais sem nunca beliscar a maior delas: porque é que não se erradica a maçonaria? Numa época em que a crise encerra tantas lojas inocentes, algumas não deixariam saudades. No mínimo, tomava-se à letra a inclinação da seita pela privacidade e impedia-se aos seus devotos o desempenho de funções públicas. Alegadamente, os maçons não querem ser conhecidos. Comprovadamente, nós só ganhamos em desconhecê-los.