(Texto e foto aqui)
Victorino d'Almeida afirma que o repertório musical
mais apreciado é fraco
O maestro António Victorino d'Almeida, autor da
mensagem da Sociedade Portuguesa de Autores para Dia Internacional da Música,
que se celebra na terça-feira, afirma que o repertório musical mais apreciado é
o mais fraco.
O maestro e compositor disserta sobre "os
diversos graus de qualidade [da música] que vão do bom ao muito bom, do óptimo
ao genial", afirmando que "não será tão desejável chafurdar numa
pesquisa entre o mau e o muito mau, o péssimo e o horrendo".
"E eu estaria ainda tentado a citar o nada, que
julgo ser um repertório cada vez mais promovido e mesmo apreciado, fenómeno que
se reveste de uma lógica de mercado perfeitamente inatacável: os autores desse
alegado nada podem desaparecer sem quaisquer problemas, de forma trágica ou
prosaica, por falecimento ou entrada para a função pública, pois haverá sempre
material em stock pronto a substituir o seu esforço criativo", escreve o
maestro.
Numa mensagem de cerca de 4.000 caracteres, o músico
realça que "antes de mais nada", é "necessário que se levante
[...] o problema do subjectivismo que terá infalivelmente que presidir a um
julgamento da qualidade" e questiona: "Haverá, com efeito, um
critério rigoroso que possa de algum modo garantir que esta música é boa ou má,
transcendente ou... até nada?!".
O compositor defende que "será correcto que se
valorize a harmonia de um trecho em que o acorde sobre a qual assenta todo o
discurso musical, a chamada tónica, apenas se desloca para o acorde do quinto
grau, a chamada dominante, regressando logo de seguida ao ponto de partida,
depois de um curta e prudente passagem pela subdominante, que fica quatro notas
acima".
Autor de mais de 50 obras eruditas, como "Páscoa
no Minho", para Victorino d'Almeida "os termos erudito ou sério
sempre significaram alguém que 'sabe muito' ou alguém que cumpre o elementar
preceito de ser honesto".
Ao longo da mensagem, o autor do "Fado do Campo
Grande", desmonta os diversos conceitos em torno da música e a dado passo
afirma: "eu nunca atribuí ao adjetivo ligeiro um sentido pejorativo, pois
também sempre considerei que comer uma refeição ligeira não significa comer
mal".
O maestro crítica "o vício de classificar e de
qualificar [que] ainda se torna mais penoso quando as pessoas se esquecem de
que há diversas situações em que uma certa música, seja qual for o estilo, pode
tornar-se desejável ou aberrante, pois o sentido do Belo também se insere na
eterna questão do Bom Senso e Bom Gosto".
A terminar, Victorino d'Almeida refere que "a
sociedade portuguesa, ignora quase completamente todo um vastíssimo património
de obras de arte geniais.
"É possível viver sem se conhecer nenhuma peça de
Shakespeare, de Tchekov, muito confundido com Tchaikowsky em meios alegadamente
mais cultos, pois os ignorantes puros nunca ouviram falar de tal gente, de
Brecht ou de Samwel Becket", questiona.
"É possível, em suma, viver sem o Belo?",
interroga o maestro para responder ele próprio: "Claro que é possível! É
evidente que é possível, pois as pessoas podem inclusivamente viver castradas e
encontrar formas mais ou menos divertidas de passar o tempo, [...] sem dúvida
que é possível viver assim. Mas não é a mesma coisa...".
NOTA - Repare-se no preciosismo e rigor jornalístico, que não só nos informa sobre o número de caracteres do texto escrito por Victorino de Almeida como nos dá conta da inestimável descoberta literária por ele feita: a de um tal Samwel Becket, que eclipsará a obra e a memória do outro Becket, Samuel.
NOTA - Repare-se no preciosismo e rigor jornalístico, que não só nos informa sobre o número de caracteres do texto escrito por Victorino de Almeida como nos dá conta da inestimável descoberta literária por ele feita: a de um tal Samwel Becket, que eclipsará a obra e a memória do outro Becket, Samuel.
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