Chegou-me às mãos, dias atrás, este livro, editado pela Três
Estrelas, de S. Paulo. Com pouco mais de 100 páginas , é constituído por três
textos de filosofia política, assinados por Luiz Felipe Pondé, Denis
Rosenfield, ambos brasileiros, e pelo português João Pereira Coutinho. O prefácio é de Marcelo Consentino. Deixarei de lado os textos de Pondé e Rosenfield, para me centrar no de Pereira Coutinho.
Conhecia-o das suas participações em
programas televisivos de debate sobre a actualidade política em Portugal bem
como das crónicas que assina regularmente no jornal Correio da Manhã. Em ambos os casos, o que distingue as suas
participações das dos restantes comentadores ou cronistas é a elegante irreverência
e, frequentemente, a subtil ironia (haja alguém!) com que costuma responder ao
que lhe perguntam ou tratar o que se sentiu motivado a abordar.
O texto incluído neste livro mantém essas características, aliadas
a um tom mais intimista, tornando a sua leitura muitíssimo fluida. E surpreende ainda duplamente quem avalie a dimensão intelectual de João Pereira Coutinho pela
inevitável maior leveza dessas suas intervenções públicas.
Em primeiro lugar, porque nele se organiza e estrutura, sinteticamente
mas com rigor, uma reflexão documentada e aprofundada sobre a relação possível
entre racionalidade, utopia e Estado, sobre as oposições entre “políticas de fé”
e “políticas de cepticismo” (para utilizar os termos de um inspirador maior de
qualquer dos três ensaístas: Michael Oakeshott
- cuja obra continua, quase completamente, por traduzir, sinal
inequívoco do obscurantismo a que o reinante e opressivo quadro mental da
esquerda nos conduziu). Em segundo lugar, porque consegue que as sucessivas
conclusões, mesmo as mais complexas, sejam facilmente apreensíveis pela sua
formulação numa linguagem do melhor (leia-se: mais sábio) e delicioso senso-comum.
Um texto a descobrir, com a urgência justificável pelo vazio
de ideias que, dia a dia, vai engolindo irremediavelmente o país.
1 comentário:
Inteiramente de acordo. Ou melhor, só uma coisa queria inflectir no texto de Gonsalo: o vazio que vai engolindo o país. Melhor será dizer-se: os vazios que nos vão engolindo, pois trata-se de uma acção deliberada, fascizante e opressora que tem agentes bem conhecidos. E não se pode exterminá-los...essa é que é a realmente má.
Noiva de Barcelos e Tonho de Carcavelos
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