(imagem obtida aqui)
Subscrevo o que é dito neste artigo por Alberto Gonçalves, no DN:
Segundo o próprio, Mário Soares não viu tanta fome em
Portugal "nem no tempo de Salazar". O que explica isto? Na versão
clínica, talvez a hipótese de a memória do dr. Soares sofrer de alguns percalços.
Na versão conspirativa, talvez a hipótese de o dr. Soares afinal não passar de
um revisionista de Maio disfarçado de campeão de Abril. Na versão plausível,
talvez a hipótese de o dr. Soares proferir os disparates que julga necessários
aos seus objectivos.
Hoje, é ele mesmo quem confessa: "Toda a gente
diz na televisão que não há dinheiro para comprar pão, para comprar nada, tem
de ir pedir, ir aos caixotes de lixo. Alguma vez se viu isto em Portugal? Eu
tenho 88 anos e nunca vi. Sinceramente nunca vi, nem [todos juntos, agora] no
tempo de Salazar." Em suma, a perspectiva histórica de um dos maiores
vultos do Portugal contemporâneo fundamenta-se exclusivamente no que lhe chega
através dos "telejornais", inexistentes ou inconsequentes durante o
Estado Novo e incansáveis em denúncias, com ou sem aspas, desde que, para
irritação de muitos amigos do dr. Soares, Cavaco Silva abriu as ondas
hertzianas à iniciativa privada.
O dr. Soares responde por ele, mas num país menos
exótico atoardas assim não se limitariam a demonstrar ignorância ou má-fé:
prejudicariam a causa que actualmente o motiva, leia-se o derrube do Governo. O
Governo é uma desgraça? Com certeza. Sucede que, em primeiro lugar, não é uma
desgraça pelas razões avançadas pelo dr. Soares, já que uma política que esfola
os contribuintes para preservar o Estado lembra bastante mais o socialismo do
que o mítico "neoliberalismo", esse consolo dos simples. Em segundo
lugar, o Governo não é uma desgraça comparável à regência de Salazar pela
prosaica razão de que, ao contrário deste, o dr. Passos Coelho foi livremente
eleito por uma razoável quantidade de cidadãos, eventualmente superior às 70 ou
80 alminhas subscritoras da carta do dr. Soares a pedir a demissão do
primeiro-ministro. Em terceiro e último lugar, as hipérboles tendem a
ridicularizar os seus autores, e só um território de pasmados justifica a
tolerância de que o dr. Soares dispõe.
Sem dúvida que a iliteracia do tempo facilita o
exercício. Bush invade o Afeganistão e o Iraque? Bush é igual a Hitler. Israel
defende-se de ataques terroristas? Os líderes israelitas são iguais a Hitler.
Merkel recusa financiar-nos incondicionalmente? Merkel é igual a Hitler. Os
novos mapas do iPhone não primam pelo rigor? A Apple é pior do que a Gestapo.
Até ver, o dr. Passos Coelho fica-se pela equivalência (desfavorável) a
Salazar. Se, um dia, executar uma reforma digna do nome, é garantido que a
rigorosa escala do dr. Soares o colocará a par do Führer, o padrão de medida em
vigor. Não seria mais idiota se comparássemos o dr. Soares por exemplo a
Estaline, com a atenuante de que o dr. Passos Coelho nunca integrou a Mocidade
Portuguesa nem alimenta simpatias evidentes pelo Terceiro Reich, enquanto o
"pai da democracia" serviu indirectamente o "pai dos povos"
ao longo de sete anos. Contra Salazar, que pelos vistos não merecia a desfeita.
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