sexta-feira, 10 de maio de 2013

PARA UM FIM DE SEMANA SALUBRE...



(imagem obtida aqui)

     …nada melhor que um poema (intemporal, hélas!) dos que nos abrem a alma à delícia de sabermos e podermos ler (ainda) sem sermos obrigados a mote (pseudo-prafrentex).

   Agora que, em certos sectores, de forma mui discreta (ou seja, descarada) se tenta solapar – a pretexto de um novo PREC que mais não visa que colocar em epígrafe gente tão nefasta como alguma que ora nos rapa a paciência e os tostões – quem mostre veleidades de pensar pela própria cabeça e não embarque em demagogias que só procuram que saltemos da frigideira para cairmos no lume, vozes e escritos de gente livre fazem cada vez mais sentido.
   Desta feita é António Luís Moita (há meses falecido mas que, para nosso gosto, continua muito presente e cujos poemas, desde os de recorte lírico e alquímico aos mais interventivos estão perfeitamente potáveis) que nos fará companhia por uns minutos… ou talvez mais que isso.

(imagem obtida aqui)

                                                
MONÓLOGO DO ELEITOR

Acabaram-se as Direitas?
Dissiparam-se no Centro?
Serão as Direitas feitas
de esquerdino movimento?

Sendo as Esquerdas sujeitas
ao mesmo vaivém do vento,
vão, com as nuvens, direitas
à parte esquerda do Centro?

E o Centro? O que é o Centro?
Em que centro se situa?
No centro do Centro-Centro
de um satélite da lua?

É um Centro direitista
para a Esquerda cor-de-rosa?
Ou a tendência sinistra
da dextra silenciosa?

Que Centro é esse? Um sinal
de não comprometimento?
Ou, ao contrário, um invento:
manobra do Capital?

Será o Centro a Direita?
Fascismo com meiga fala?
Medo? Angústia? Um olho à espreita
com raiva de não ser bala?

E a Esquerda? O que é a Esquerda?
Para a Direita, agonia?
Para o Centro, mesmo Esquerda?
Para a Esquerda mais esquerda
retrocesso à burguesia?

E a esquerda Extrema-Esquerda
- a que tudo desagrega –
o que será quando vemos
que a Direita se lhe pega?

Será mesmo Extrema-Esquerda
a pedir terra queimada?
Ou um braço que a Direita
manipula encapuçada?

Será cravo de pureza
ou goivo de gula grada?
Lirismo? Farsa? Utopia?
Concreta antropofagia,
fim do dia ou alvorada?

Ou nem sequer há Direitas
nem Esquerdas, nem mesmo Centro,
sendo isto ideias estreitas
em que aprendiz me concentro?

Serei eu, nascido outrora
quando só Direita havia,
que ga-ga-gaguejo a História
da De-de-democracia?


(imagem obtida aqui)

                                                           ALM
                                                           in “Poemas Temporais”
(Este poema foi-me enviado pelo A. para ser dito numa das emissões do programa “Mapa de Viagens” que eu então realizava numa das rádios portalegrenses).

3 comentários:

Luís Dolhnikoff disse...

Caro NS,

A poesia que une inteligência, humor e proximidade com o mundo real é hoje tão rara quanto bem-vinda.

Um grande abraço.

Joaquim Simões disse...

Quem falava assim não era ga-ga-gago.

Anónimo disse...

Agradeço as vossas msg.
Na revista do TriploV, a sair em 15/16 próximo/s, evocação de ALM com, incluído nela, outro poema singular. Em breve, dada a atitude apreciativa de leitores daquela Página Cultural, mais 3 poemas excepcionais do A., de diferente enfoque. E que o creditam como uma das vozes mais belas - no meio de tanta parlapatice epigrafada e festejada pelos partidões ou os amigalhaços medíocres - deste país que nos tempos de Pessoa festejava o padre Carlos Matos e enxovalhava o autor de "Mensagem"...
ns