sábado, 11 de maio de 2013

Da superioridade cultural do cristianismo




G. K. Chesterton


A propósito do texto anterior do Luís Dolhnikoff, "É tudo verdade", e dos comentários e respostas que suscitou até agora, lembrei-me deste, que publiquei, pouco mais de um ano atrás, no Fiel Inimigo:


A nossa época é uma época profundamente obscurantista. E tanto mais obscurantista quanto mais se arroga a representação exclusiva e definitiva de um pensar objectivo, laico e humanista, isento de anteriores superstições impeditivas do acesso à verdade e à liberdade, às liberdades, espelho de uma imparável evolução da Humanidade.

Uma das ideias nela muito difundida é a de que todas as religiões se equivalem:


 - ou porque todas elas resultam de um apelo do e a um Transcendente comum e que, pela parcialidade e correspondente sectarismo de cada uma dessas visões, todas elas comungam de iguais virtualidades e culpas nos seus efeitos sociais e políticos - sobretudo culpas;


- ou porque se limitam a reflectir o temor e o tremor da humanidade, e benefícios em busca de uma protecção na luta contra os elementos hostis e ameaçadores da sua existência, antes deste dealbar da sua libertação pelo pensamento científico e respectivas conquistas;


- ou porque não passam de uma artimanha destinada a que uns quantos cimentem o seu poder sobre os restantes, manobrando-os e explorando-os mais facilmente e a seu bel-prazer;


- ou porque resultam de uma síncrese de todos estes factores, próprios, uma vez mais, de uma espécie que não atingiu, e estará ainda muito longe, da sua maturidade - e ainda que, céus!, se dirige já para as estrelas, podendo contaminar todo o universo com a sua moléstia moral.


Neste papaguear generalizado entre os eruditos e disseminado superficialmente através de uma vulgata dos conceitos – entre a maioria dos políticos e a restante população da civilização ocidental (mas só desta!) – com a preciosa ajuda dos jornalistas, esses aprendizes da informação que tanto têm contribuído para a generalização da confusão e da degradação -   um dos pontos fortes da autoflagelação decadente da moda é que o cristianismo é uma religião como qualquer outra.

E não é.

Dizia Chesterton que os cristãos não são nem melhores nem piores do que os outros. Só são piores na medida em que teriam a obrigação de serem melhores.

Chesterton tinha toda a razão.

No cristianismo, e só no cristianismo, se encontra a raiz que levou ao surgimento do conceito de humanidade, de uma irmandade humana, pela ideia de uma cristandade universal – o budismo, ao dirigir-se a todos os homens mas ao fazer da salvação individual a sua pedra de toque, nunca foi capaz de o gerar.


E, mais ainda do que no budismo, é no cristianismo, e só no cristianismo, que a violência é condenada. Porque o é mesmo que em favor de Deus, quando Pedro é repreendido por Cristo ao puxar da espada para defender o Mestre. Porque Deus só é Deus de alguém enquanto for resultante do seu livre reconhecimento enquanto tal.

É no cristianismo, e só no cristianismo, que o estádio de desenvolvimento humano a que chamamos infância é valorizado pela boca do próprio divino, conferindo assim dignidade à totalidade da existência humana, dois mil anos antes do nosso tempo.

É no cristianismo, e só no cristianismo, como também Chesterton põe em relevo, que da boca do Enviado de Deus, um mero carpinteiro, saem não impropérios, ameaças, condenações e afirmações de grandeza, mas coisas do mais elementar bom senso, como um “que atire a primeira pedra quem ainda não pecou”. E em que, acrescento eu, o corpo é declarado como o Templo dos templos a Deus.

Estou a ouvir quem leia o que acabei de escrever a ripostar-me de imediato: “Mas, ó meu caro, não tem sido a história do cristianismo a negação de tudo isso ou, pelo menos, a sua negação quase total, a negação da vida? As crianças, por exemplo, não foram elas tantas vezes utilizadas, mal tratadas ou mortas no meio do fanatismo da cristandade? Não foram os não-cristãos tantas vezes perseguidos e aniquilados?”.

Sim.

Mas há nisso tudo uma diferença essencial, crucial.

É que os princípios nos quais dizem firmar-se os que o fizeram, os condenam sem equívocos, tal como Chesterton faz notar.

A cristandade terá, tal como os muçulmanos e outros o têm feito recentemente e por diversas vezes, sacrificado crianças e jovens para fins políticos e ambições pessoais, apresentando-os como “mártires do Reino de Deus”. Mas, ao contrário dos restantes, que nisso são sancionados pelos seus textos sagrados, o Evangelho faz desses cristãos mentirosos e condena-os a um julgamento divino inexorável.

A cristandade poderá ter sofrido poderes discricionários e prepotentes em nome de uma Cidade de Deus governada por iluminados de todos os matizes. Mas é nos textos cristãos – no “quem não é contra nós é por nós” (astutamente invertido pelo ditador Salazar) e no episódio da Paixão de Cristo que referi – que estão as sementes e as raízes da argumentação de John Locke em prol de uma sociedade democrática. A democracia ocidental tem a sua origem no cristianismo, não na “democracia” grega, assassina de Sócrates, o único democrata de Atenas, como ele sabia e disse aos seus juízes, incomodando-os e irritando-os.

A cristandade poderá ter depreciado o corpo como Templo de Deus, como o laboratório da Vida, criada por Deus. Mas essa depreciação e mesmo a sua mortificação é fruto (como qualquer estudante de Filosofia ou de Cultura Clássica o sabe) da infiltração dos misticismos grego e oriental, que consideravam o corpo como o túmulo da alma, logo no cristianismo dos primeiros séculos (“soma”, corpo, e “sema”, túmulo, têm a mesma raiz). Porque a sua glorificação vem, no Evangelho, na boca do próprio Cristo.

De facto, os valores que – ateus, crentes ou nem por isso – dizemos contemporâneos e as características que atribuímos aos seres humanos da futura humanidade diferente, tudo isso se encontra no Evangelho. Porque o cristianismo é diferente de tudo o mais.

Este o sentido da frase de Chesterton, para quem ele é a única religião que celebra a Vida, na acepção mais fundante do termo.

Defender os valores cristãos é, portanto, como se vê, defender e incentivar a evolução da espécie humana na própria óptica dos ateus e dos indiferentes e não o oposto, como o venenosamente prepotente obscurantismo reinante na nossa era pretende. E isto leva-me a um último aspecto não menos importante, o qual, em profunda relação com os anteriormente apontados, se torna também não menos decisivo.

O cristianismo é, enquanto religião do corpo, uma religião do finito e, por consequência, do limite. O mundo, qualquer mundo, é “o lugar” e por lugar entende-se algo de-limitado, de-finido. Donde se infere, por tabela, dois planos distintos inter-relacionados – tal como a pele é, em simultâneo, o que, separando-nos, nos liga inevitavelmente a tudo o mais. O mundo é o plano do limite, é “o caso”, na deliciosa expressão de Wittgenstein, o que faz com que tudo o que nele acontece tenha, necessariamente, limites.

O Cristo que toca os corações das boas almas de todos os credos e continentes, que anda na boca dos cantores de rock, nos discursos e cerimónias do correcto humanismo do Ocidente de todos os quadrantes políticos e que eu próprio pus em destaque, até agora, nas suas implicações mais profundas, é o Cristo compassivo, manso, misericordioso. A sua firmeza é a firmeza da resistência, de certo modo passiva, à barbárie, firmeza que afirma o que a esta se opõe.


O Cristo de que não falei e que todos eles, por diferentes motivos, procuram ignorar o mais possível é o outro, o que expulsou os comerciantes do Templo, chamando-lhes ladrões, virando-lhes as mesas e mesmo chicoteando-os. Coisa estranha, já que aparentemente contraditório não apenas com o fundamental da sua atitude e mensagem mas também com o facto de ser uma característica da Antiguidade que todos os actos fundamentais da vida humana, do comércio ao acto sexual que consumava o casamento, tivessem lugar no templo, assim ligando o mundo profano ao mundo sagrado, com o Templo no lugar de “pele” do profano.

Ironicamente, é a esquerda, na sua superficialidade, a que menos vira a cara e mais se aproxima de um enquadramento lúcido ao que é narrado. Na época, essa relação entre o profano e o divino estaria – dizem-nos os documentos que nos dão conta do ambiente religioso entre os judeus da época, divididos entre o judaísmo tradicional e o judaísmo helenizado, o ascetismo orientalizado e outras tendências que incluíam elementos das diferentes religiosidades presentes na região, num crescente clima de relativismo – muito desvirtuada pelo pendor para o mero comércio a pretexto do religioso.


Se Pessoa, na Mensagem, diz que no Portugal em que vive, “ninguém sabe que coisa quer/ninguém sabe que alma tem/ nem o que é mal nem o que é bem”, isto é, que Portugal, não tendo limites, não existe por falta de limite, por inexistência de de-finição que o faça existir, pela separação que o torne dinâmico (e note-se que definir-se é o oposto de tornar-se rígido), que o torne significativo, sinal da presença de algo vivo, Cristo age no mesmo sentido.

Cristo age e, pela acção, marca o limite a partir do qual deixa de ser possível estabelecer a ligação e a interacção entre o homem, a sua acção e o seu destino, isto é, deixa de ser possível criar vida entre o sentido e o valor que a serve e a mede. Ao expulsar os mercadores do Templo, não está a condenar os exploradores do povo mas a travar o esvaziamento da existência humana para o nível da mera sobrevivência animal, mais aperfeiçoada e sofisticada, a afirmar um conjunto de valores vitais.


Porque não é possível transigir sem que isso implique o desaparecimento e a morte de quem transige. E se são os vendilhões quem representa e concretiza tal degradação e perigo, cristianismo significa não unicamente resistência activa, mas acção clara de repúdio.

Este é um Cristo que estraga os “arranjinhos” sempre possíveis de serem feitos com o lado que fica melhor na “fotografia”, publicada pela comunicação social com a conveniente regularidade. É um Cristo inconveniente, incómodo, não contextualizável na hipocrisia funda que vivemos. É um Cristo que não serve ao farisaísmo humanista, porque é um Cristo afirmativo.


E se há algo que faz guinchar os vampiros da cultura ocidental da nossa praça, que vivem do esgotamento da sua vitalidade, mistificando-o sem escrúpulos para servir os seus fins, é uma afirmação de cristianismo.

Concordo com Montesquieu quando aconselha a que não se pretenda dizer tudo no que se escreve, para que também o leitor possa completar assumir o texto e as suas conclusões, pela compreensão e pelos raciocínios que com ele aproveitou para fazer. Limitar-me-ei, portanto, por esse motivo e por escassez de tempo, a sugerir a quem teve a paciência de me acompanhar até aqui, que imagine o que eu poderia dizer quanto ao que provavelmente seria, a meu ver, a acção de Cristo no caso do juiz que sobrepôs a sharia à lei americana, referido no post d’O Lidador.

Peço desculpa pelas gralhas que possa haver no texto, inclusive as de ligação, mas já não tive tempo para o rever.

14 comentários:

Unknown disse...

É sempre bom recordar este texto, não só pelo que diz, mas tb pela forma como o diz.

Na Quinta-Feira estive no Porto, num painel com D. Manuel Clemente, Bispo do Porto, e tive ocasião de, na minha intervenção, referir estas características diferentes do cristianismo.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luís Dolhnikoff disse...

Caro JG, permita-me civilizadamente discordar de tudo ou quase tudo o que escreveu aqui. Sendo sintético, creio que o obscurantismo de nossa época radica em grande parte num neorregiliosimo generalizado, salvo certas exceções geográfias, como a Europa Ocidental, e no relativismo que questiona a herança racionalista moderna. Concordo apenas, claramente, que as religiões não são iguais. Mas, em suma, como judeu, sua interpretação da história das ideias por um viés cristão me soa "cristianocêntrcia" apenas. Mesmo porque, o referido "universalismo" cristão, desde os Pais da Igreja, excluía os judeus enquanto tais. Nas orações de sexta-feira, até o Concílio Vaticano II, havia uma parte especial para lembrar não a salvação, mas a condenação dos judeus. Além disso, eu poderia afirmar que o conceito de humanidade nasce no judaísmo, entre outras coisas, com a origem comum no mito de Adão e Eva, depois com as leis comuns, pela primeira vez na história, que valiam desde o rei ao escravo, como as dos Dez Mandamentos e do Levítico etc. O famoso exclusivismo judaico, de pretenso "povo eleito", jamais significou a desumanidade do Outro, como muitos povos e muitas religiões advogam ou advogaram.

Luís Dolhnikoff disse...

PS

Não por acaso, o cristianismo é uma criação judaica, e uma seita judaica na origem. Mas não quero fazer a defesa do judaísmo em lugar da do cristianismo, mesmo porque, sou generalizadamente antirreligioso. E também porque o cristianismo é, afinal, uma síntese entre judaísmo e religião e filosofia greco-romana. O próprio conceito de alma imortal individual cristão é uma criação original de Platão, no contexto de seus "Eide", ou Essências, do mundo supralunar. Não haveria cirstianismo algum sem judaísmo e platonismo, para não falar dos deuses-lares romanos, origem dos santos etc.

Luís Dolhnikoff disse...

PS 2

Para mim, como para qualquer judeu, é impalatável a crença nas pretensões universalistas e mesmo humanistas da teologia que criou o antissemitismo.

"Era no início de uma forma de ódio antijudaico que não havia aparecido no palco da história antes do advento do cristianismo, e que foi construído sobre uma visão [...] de que as Escrituras judaicas [na verdade] testemunham sobre Cristo, que foi [portanto] rejeitado pelo seu próprio povo e cuja morte, por sua vez, leva à condenação desse povo" (Bart D. Ehrman, "Evangelhos perdidos", Rio de Janeiro, Record, 2008).

José Gonsalo disse...

Luís:

Pelo contrário, agradeço a sua discordância, porque ela poderá dar-me oportunidade de esclarecer muito daquilo que, num texto tão curto, fica necessariamente por dizer ou demasiadamente nebuloso. Aliás, confesso, e peço desde já que me desculpe a "maldadezinha", não o republiquei inocentemente, fi-lo porque sabia de antemão que teria feed-back desse lado e um feed-back que, por ir certamente fundo, mo permitiria.
Só não prometo responder-lhe ao mesmo ritmo por andar cheio de coisas para fazer. O que é, de certo modo, desleal. Mas o que é que quer, não consegui resistir à tentação...! Pronto, lá cometi um pecado!
Abraço.

José Gonsalo disse...

Mas prometo que amanhã já lhe deixo um primeira resposta. Talvez em post, de modo a ser mais fácil a quem queira acompanhar a discussão deste assunto.
Mais uma vez, abraço.

Luís Dolhnikoff disse...

Pois eu sabia que você o sabia... (do feedback). É um debate muito interessante e relevante, em todo caso, e não há por que ter pressa.

Um grande abraço

Luís Dolhnikoff disse...

Já que você fala em "maldadezinha", JG, devo confessar uma "maldadezona". Tenho um livro-ensaio inteiro sobre essa discussão, infelizmente ainda inédito (e que preferiria talvez publicar em Portugal do que no Brasil, pois aqui tais questões pouco tropiciais são consideradas extravagantes ou desinteressantes: "As asperezas da crença: a religião no mundo contemporâneo"), de que tiro rapidamente todas as citações e referências que por aqui utilizo... Mas isto ao menos prova que fiz o "dever de casa", como se diz aqui. Aliás, agradeceria se algum de meus amigos portugueses pudesse indicar editoras lusas potencialmente interessada em tal tema.

Ab, L

Unknown disse...

LD, tb já tive essa visão jacobina da religião. Mas o tempo e a leitura levaram-me a perceber que ao homem não basta a razão. Somos seres racionais mas não somos apenas isso. Temos mesmo necessidade de um transcendente, porque nos projectamos no tempo e mesmo para lá do nosso tempo.
Não por acaso, as ideologias saidas do racionalismo, depois de matarem deus, tiveram de recriar deuses abstractos. Entre o judaísmo e o cristianismo, como doutrina, não há grande diferença, penso eu. Cristo limitou-se a sintetizar e interpretar os grandes mandamentos judaicos, colocando a ênfase no perdão. O perdão e a representação do Cristo, como cordeiro sacrificial, desloca a expiação do real para o transcendente, o que contribui para quebrar o ciclo de vingança, pacificando as coisas.

Luís Dolhnikoff disse...

Tudo verdade, JC. Somos muito pouco racionais, pois racionais numa superfície cortical sobre uma enorme base de herança darwiniana. Daí eu considerar que precisamos sempre mais de racionalismo. E obviamente cristianismo e judaísmo tem muitíssimo mais semelhanças e proximidades de fundo do que diferenças de superfífie. E, sim, a "morte de Deus", prevista já por Marx, levou à criação de mitologias alternativas, sem dúvida mais pobres que as grandes religiões, e não necessariamente menos deletérias ou perigosas, em termos culturais e políticos, como o ambientalismo como religião pagã, o relativismo como niilismo intelectual, o multiculturalismo como forma de antiocidentalismo etc. Apenas que não faço essa separação entre crenças boas, as das grandes religiões, e crenças más, as do "pós-modernismo". O único "ismo" a que posso aderir é o ceticismo, mas não numa adesão de militante, pois me recuso a ser um cético "ativista", sendo-o por convicção intelectual malgrado eu mesmo, ou por exaustão.

Unknown disse...

"Apenas que não faço essa separação entre crenças boas, as das grandes religiões, e crenças más, as do "pós-modernismo". "

POis não faz. Mas devia fazer, porque está a incorrer num dos principais erros do relativismo cultural, ao recusar perceber que as religiões são mesmo diferentes. E isso faz toda a diferença.
Eu tb sou agnóstico, infelizmente não acredito num Deus moral, mas vejo, claramente visto, que o homem necessita de acreditar em algo maior do que ele, que não é só razão. Sim, a razão é uma parte importante, muito importante, mas não é tudo. Só o homem, que tem consciência de si mesmo, desenvolveu religiões. E fê-lo em todas as latitudes e lugares. Recusar perceber esse fenómeno, colocando-lhe um rótulo de " é tudo a mesma coisa", implica recusar apreender toda uma dimensão das coisas.

Anónimo disse...

Cito: "vejo, claramente visto, que o homem necessita de acreditar em algo maior do que ele, que não é só razão". É a sua opinião - e nada mais. Não tem valor probatório POR SI MESMO. E isto, também, porque não sendo o Homem só razão, não se segue que tenha, por isso, de se entregar à crença, À SUBMISSÃO, porque é disso que se trata, aos conceitos e fideísmos dos que num deus acreditam e MANDAM NO MUNDO MENTAL E ÍNTIMO A ESSE PRETEXTO. Mas de facto é nisto que bate o ponto: a crença num Deus ter de ser seguida da Obediencia aos seus áulicos. O mal não está pois em deus, eu por exemplo dou-me perfeitamente com Deus, o mal está nos que falam em seu nome e, autoritariamente, acharem que a sua é a voz de Deus...(Já se percebeu que isso não passa dum truque, duma insolencia, duma fraude). Tão grave no Cristianismo como no Islamismo ou noutra qualquer. O acrescento de maldade vem disto: no Cristianismo não és imediatamente preso ou abatido; no Islamismo sim.
Mas, seja no intuito de um Manuel Clemente ou no de um mullah, o que se pretende é que o ser humano creia, pratique e viva conforme o ditame dos Antístenes. As nuances apenas teatralizam o que se segue. E, por último, o regime nazi não era uma Democracia, como por exagero (?) JC sugere ou diz: era uma ditadura que, antes de se ter firmado, APROVEITOU um detalhe eleiçoeiro, que nem sequer foi livre. Goering, mestre de más mestranças, disse-o num comício da cervejaria da Unter den Linden:"Aproveitaremos as facilidades e normas da democracia de Weimar para os destruirmos mais depressa". O problema, portanto, não é a democracia nem Cristo: é os falsos democratas e os falsos adeptos do Galileu. E, claro, o autoritarismo de base que toda a IGREJA assume e tenta perpetuar. Daí os massacres, daí as prepotências, daí a infamis que toda a Religião Revelada traz consigo. E Deus está tão longe...
é-lhes fácil pois manejar e tripudiar em seu nome. Pois Fátimas e quejandas não são apenas uma burla, são um aproveitamento indecoroso, de tal forma que a própria ICAR não a toma como dogma. Mas, após Woityla, o falso santo, estimulam-na de forma totalitária. Pois não...

Pedro Heitor

Anónimo disse...

Cito: "Só o homem, que tem consciência de si mesmo, desenvolveu religiões. E fê-lo em todas as latitudes e lugares". Não é verdade. Com o devido respeito e com exemplos, não é verdade Mas sei que JC não diz isto por desonestidade intelectual ou perfídia fideísta, mas apenas porque está mal informado. Passo a informá-lo: o Homem não desenvolveu, sempre e em todas as épocas, em consciência e em seu foro íntimo, religiões (formalizadas, reveladas, canónicas) o que é um dado relativamente recente. Na pré-história desenvolveu o que se chama "para-religiões" (vide Joseph Maringer e E.O.James). Eram totens ou tabus animalistas ou do mundo circundante(vegetais, minerais, de habitat). A conceptualização era-lhes alheia. Só se desenvolveu posteriormente, através de REVELAÇÃO, ou seja e para seguirmos Richard D. Baltrusaitis, "contacto com entidade (anjo, personagem ou emanação)inscrita na Realidade". Segundo ponto: os índios a partir da região sonoriana não possuíam religião. Criam sim no Grande Mistério ou Grande Medicina, que eram para eles as forças encarnadas da Natureza e do espaço-tempo. O Manitú e quejandos foram criações lexicais dos brancos invasores, primeiro, depois plasmadas no léxico de Hollywood e reproduzidos até à saciedade. Finalizando: o problema está em que as "religiões reveladas" traduzem SEMPRE uma obrigatoriedade em relação aos interesses (pois é disto que se trata) da Entidade propulsora. Depois mantida, incrementada e, frequentemente e nos casos maléficos, distorcida (no Caso do Cristianismo) ou criminal de base (caso do islamismo). É verdade que o "esquerdismo", que no fundo tem uma feição Ur-Fascista, e o racionalismo estreito, derrocaram ou tentaram derrocar "religiões reveladas", criando em substituição preceitos tão ou mais nefastos. E isso porquê? Porque os seus próceres visavam - tal como os próceres das "religiões reveladas", USAR o vulgus pecus. O Futuro, impreterivelmente, trará o verdadeiro racionalismo, que é o que em sã existencia recusa umas e outras, de forma realmente consciente. E quem, de forma cínica, achar que o Homem tem de ser um "símio di Dio", é tão criminal como os que queimavam ou rebentam com pessoas de Outro Cariz. Ou os metiam na Lubianka apenas por rezarem (os totalitarismos equivalem-se). Por último, quando uma pessoa, posta entre a possibilidade de salvar um filho/uma esposa ou, benevolente, 2oo ou mil pessoas alheias, opta por salvar um filho/uma esposa - não o faz por ser SEU/SUA, mas sim por o/a AMAR. Além disso o exemplo é isso, um exemplo apenas. Ou seja, uma "realidade construída" como exemplo propositivo. Que não tem incursão cognitiva na Realidade, social ou formal, mas apenas no campo da "hipótese de trabalho". E é disto que parte a opinião global, que aliás respeito mas da qual tenho de, urbanamente, discordar de JC.

"Pedro Heitor", née F.Gonçalves