Uma crónica de Ferreira Fernandes, no DN:
Numa escola, uma criança não pode ser
castigada por um erro que se sabe que ela não cometeu. Dito isto, passemos ao
recreio. Há pais que não pagam o almoço escolar do filho, mas não prescindem
das cervejolas que custam o mesmo? Sim, tá bem, adiante... O almoço nas escolas
devia ser grátis? Sim, claro, e fechar os olhos às notícias também... A
diretora da escola, como mostrou o cameraman, pinta as unhas? Pois, e as
jornalistas vão para as reportagens de camisa coçada... Uma deputada da
oposição interpelou o ministro pela desgraça da fome? Claro, e deve ter deixado
de falar aos colegas que andam de Audi A5 público... Fim do recreio. Voltemos
ao tutano: uma criança de cinco anos foi separada dos colegas e levada para uma
sala onde não lhe deram almoço, deram-lhe outra coisa, porque os pais não
pagaram a alimentação dela. E se calhar lá em casa o televisor é de plasma...
Parou! Já disse que acabou o recreio. Estou-me nas tintas para os pais, para a
diretora, para o raio que os parta. Aqui é a criança que conta, só ela. Aos
cinco anos, elas são finas como jamais voltarão a ser: a castigada e as colegas
perceberam que ela foi humilhada. Isso é que conta. E o extraordinário é que
esse facto revoltante foi dissolvido em discussões laterais. Aqueles cinco anos
segregados, para a sala ao lado e para ao lado do almoço, tornaram-se um mero
pretexto. Tantas causas, tão pouca compaixão.
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