quinta-feira, 4 de outubro de 2012

A luta e a denúncia



foto obtida aqui

Apoiei, através deste blogue, a mais recente batalha da luta mais que justa dos cidadãos deficientes deste país. E tal como eu previa, nesta resposta que dei aqui a um comentário do Manuel Graça, a quem parecia que o PCP tentava colocar o movimento sob o seu controlo e colher os louros:

O que me admira é que tenha dúvidas quanto a isso. Trata-se de um risco inevitável e de consequências que o são ainda mais. Sei que há lá quem esteja alerta no que respeita a esses "pormenores", mas sinceramente, tenho poucas esperanças de que não venham a ser engolidos ou simplesmente afastados a médio ou mesmo a curto prazo. É o costume, infelizmente.

aquilo que escrevi estava certo, conforme o sublinhado que fiz neste texto do Eduardo Jorge, hoje publicado no blogue Tetraplégicos (link aí ao lado). É que conviria acabar com a escandalosa farsa trágica que estas associações de deficientes são, pôr a claro as ligações e filiações partidárias dos seus "dirigentes", também eles responsáveis  - e não só os sucessivos governos -  pelo que até hoje se tem passado, prejudicando impunemente os deficientes. Alguém já reparou que o jornal Associação, da APD, é, descaradamente, uma espécie de suplemento do Avante? Que grande, senão a maior parte do "jornal" é, "pedagogicamente" composta por textos clara e acirradamente ideológicos? Que estamos perante um exemplo da clássica estratégia marxista?

Daqui vai um enorme abraço para o Eduardo e os seus amigos e companheiros. Em meu nome e, tenho a certeza, em nome de todos os cidadãos dignos deste país, para eles os nossos maiores agradecimentos.




Nem sei por onde começar. Uns mais de perto, outros um pouco mais de longe, todos acompanharam a minha/nossa luta a par passo, por isso quero agradecer-vos e contar como foi.


Foi complicado. Além das dificuldades que tenho sempre com o transporte quando faço alguma viagem, desta vez foi a dobrar devido às circunstâncias que conhecem. Transportar cama, roupa, alguns bens e o ficar no meio da rua foi uma novidade, e é difícil prever as dificuldades.

Mas quando sabemos para onde vamos e o que queremos, todos os eventuais problemas parece que desaparecem. Nem sequer ponderamos ou pensamos sequer que vão existir. Pensamento é somente a conquista de objectivos a que nos propomos e convição que nada nos impedirá de tudo fazer para os alcançar. Já o outro dizia que o sonho comanda a vida.



Mas tudo tem um preço e eu sabia disso. Estava pronto para o pagar. Começou logo na primeira noite. Nunca pensei que passar a noite ao relento fosse tão difícil. O ter que me virar de 3 em 3 horas, não poder sair da cama para fazer as minhas necessidades fisiológicas, fazer minha higiene, as dificuldades de estar vestido e com uma almofada no meio das pernas não é nada fácil. Mas pior dificuldade foi o frio. Há dezenas de anos que não fazia uma direta. Tinha trazido de casa um edredão que me amenizou esse frio, mas começou a ficar com a cobertura molhada devido á maresia. Não fazia ideia que isso acontecia. Houve uma altura que só com a cabeça coberta com o edredão pude suportar aquele frio.





Também foi difícil lidar com a exposição. Ser o alvo das atenções foi muito esquisito. Senti-me como um animal exótico dentro de uma jaula em exposição. É muito complicado expormos tudo que temos e somos. Havia momentos que me sentia desprotegido e frágil. Na hora de mudar de posição na cama era uma delas. Nunca sabia se câmaras e olhares estavam em ação. As entrevistas e imagens foram fundamentais para dar visibilidade á causa, mas para quem não está acostumado a esse circo, como é o meu caso, torna-se cansativo. Há momentos que já não sabes o que dizer. Linhas editoriais da comunicação social também têm um funcionamento muito próprio. Falas imenso e publicam muito pouca coisa, e na maioria das vezes não o que esperavas.



Mas todo o desconforto foi sendo amenizado através do nosso convívio pela noite fora. Ver meus colegas sentados nas cadeiras de rodas 24 horas seguidas impressionou-me e era um estimulo para mim. Arriscarem sua saúde por nós não tem preço, assim como gestos fantásticos e inesquecíveis de solidariedade que eram seguidos. A Jacinta e Maria, duas manas adolescentes que nos trouxeram chá ao raiar do dia, e o choro comovente e emocionado da Maria que nos contagiou a todos, jamais esquecerei. Pedro Homem de Gouveia também me proporcionou um momento inesquecível e simbólico. Foi marcante. Conhecer sua família também foi um prazer. Meus colegas da faculdade, a Maria Ramalho foi demais, a Beta Bandeira e outros voluntários, A Beatriz com seus 17 aninhos, mas maturidade e solidariedade enormes, Jorge Figueiredo Santos e Noêmia, Maria José e muitos outros, a todos um grande obrigado. Foram enormes.




Até a amabilidade dos policias me surpreendeu. Houve horas que tinha que estar virado durante algumas horas para a Assembleia da República. Foi uma mistura de emoções estar horas seguidas tendo como angulo de visão um órgão de soberania tão simbólico, policias a protege-lo não sei de quê, céu estrelado, grilos a cantar ao fundo…Tudo isso e as emoções á flor da pele atenuarem o desconforto da noite. Ah, e como esquecer o momento passado com a Manuela na minha cama, Jel deitado no chão da calçada mesmo ali ao lado...Foi ao mesmo tempo humilhante saber que tínhamos que chegar aquele ponto para sermos ouvidos. Muito triste.




Nada agradável foi saber que enquanto nós passávamos por estas dificuldades, a APD reunia com o Governo para decidir por nós. A mim não me representam. Nunca me apoiaram em nada. Para já não destacar que maioria das associações foram convidadas a juntarem-se a nós, e ninguém aceitou o convite. Porque será que cada um puxa para seu lado? Que legitimidade têm estas associações afirmarem que lutam pelos nossos direitos, se num momento destes nos ignoram? Agora vem seu presidente afirmar na imprensa que está satisfeito com o reforço das verbas para adquirirmos Produtos de Apoios. De certeza que não foi graças ao frio e desconforto que passou ao nosso lado que conseguiu a suposta vitória. Muito mau agirem desta maneira.



De qualquer maneira valeu a pena tanto sacrifício e não me arrependo. Faria e estou pronto a faze-lo outra vez. Cada um de nós deve agir quando sente que está a ser desrespeitado. Foi isso que fiz e não me arrependo. Felizmente tudo correu bem e Governo prometeu cumprir com nossas reivindicações. Vejam aqui, e mais informações no comunicado do nosso movimento que está abaixo.




Por fim, um obrigado muito especial pela ajuda que meu auxiliar Joaquim Silva me deu e a todos os artistas presentes, principalmente a Luísa Ortigoso e Jel dos Homens da Luta. Foram muito importantes para o sucesso alcançado.






COMUNICADO DO MOVIMENTO (d)EFICIENTES INDIGNADOS


A finalidade do Movimento (d)Eficientes Indignados é lutar pela qualidade de vida das pessoas com deficiência, não é fazer análise politica.

Não reclamamos louros nem declaramos a nossa insignificância. A importância da nossa acção cada um a avaliará.




Partimos para esta luta com dois objectivos concretos:

1. Garantir o cumprimento da legislação relativa à atribuição de produtos de apoio/ajudas técnicas numa questão essencial, o carácter UNIVERSAL e GRATUITO do Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio (SAPA) que estava a sujeito a atropelos diários. Conforme fizemos prova durante esta acção.

2. Reparar a injustiça feita pelo governo de José Sócrates quando eliminou os benefícios fiscais para os trabalhadores e pensionistas com deficiência.


Em relação ao primeiro ponto e na sequência da reunião com o Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e Segurança Social, podemos informar as pessoas com deficiência e as suas famílias que nos foi garantido que todos os processos indeferidos por inexistência de verba serão reavaliados, que nenhum processo novo poderá ser indeferido por alegada falta de verba e que, ao nível dos hospitais ,não existem problemas orçamentais para aquisição de produtos de apoio.



Dadas estas garantias pelo Sr Secretario de Estado, apelamos às pessoas com deficiência e familiares para que façam valer os seu direitos e assegurem que estas garantias se verifiquem na prática e declaramos que podem contar com o nosso movimento, tal como até agora, na denúncia de qualquer atropelo ao que ficou estabelecido. Quem teve os seu processos indeferidos por inexistência de verba deve solicitar de imediato a sua aprovação.



Apelamos ainda aos técnicos da área da saúde que cumpram o seu papel e não se inibam de prescrever produtos de apoio, exigindo das administrações hospitalares os recursos que nos asseguraram que estão disponíveis. Segundo fomos informados bastará a administração apresentar as facturas que haverá reembolso da despesa.



Em relação ao segundo ponto, sobre a reintrodução dos benefícios fiscais, ficou estabelecido que o Sr. Secretário de Estado da Solidariedade comunicará ao Sr. Ministro das Finanças que aguardamos reposta até 2ª feira, dia 8, ao mail enviado dia 9 de Setembro que nunca teve resposta.



Posteriormente, em declarações à comunicação social o Sr. Secretario de Estado, que não achou oportuna a discussão desta matéria, dado o seu desconhecimento sobre a mesma e o facto não estar relacionada com a sua área de intervenção, anunciou que “será muito difícil repor os benefícios fiscais neste contexto, até porque muitos desses benefícios foram substituidos por deduções fiscais”.



Recordamos que o PSD sempre foi contra as deduções que agora invoca e sempre defendeu a reintrodução dos benefícios fiscais para os trabalhadores e pensionistas com deficiência, tendo apresentado propostas de alteração nesse sentido quando da discussão da Lei do Orçamento, nomeadamente quando da discussão do orçamento de 2009. 



Exigimos coerência. Nada mais. Não é admissível uma convicção na oposição e outra quando se exerce o poder. Aguardamos uma resposta do Sr. Ministro das Finanças.



Por fim, resta-nos agradecer todos os apoios de quem esteve connosco e de todos que declararam das mais diversas formas a sua solidariedade. Queremos, no entanto, deixar uma palavra especial a toda a comunidade das pessoas com deficiência. Por cada um de nós que esteve à frente da Assembleia da República, sabemos que há centenas que lá estariam e não não puderam porque não tiveram, nem têm condições, de se deslocar ou sequer sair de casa, ESTA LUTA FOI POR TODOS NÓS 



VALEU A PENA LUTAR. VALE SEMPRE A PENA LUTAR.



CONTEM CONNOSCO PARA O QUE DER E VIER

Sem comentários: