domingo, 10 de junho de 2012

"O mar"

Rise you O' sea

Pois. Agora é o mar. De cada vez que fala o Presidente da República vem com a história do mar, que é no mar que está o futuro de Portugal.

E é por estas e por outras que não saímos da cepa torta. O país é o que tiver que ser e será o que os portugueses, cada qual para seu lado, decidirem fazer quer trabalhando para outrem quer montando empresas quer dando condições para que empresas de fora se instalem.

O estado não tem, não deve ter, não pode ter uma ideia para Portugal que vá para além de deixar que os portugueses sigam o caminho que individualmente decidirem.

Ninguém se amofina se o estado e/ou os governos quiserem que Portugal se desenvolva, outra coisa não era de esperar. O que é de rejeitar liminarmente é que o estado, o governo, o Presidente ou a Assembleia da República, os partidos, tenham ... ideias. Ideias sobre como e para onde se deve orientar esse desenvolvimento.

A própria existência de um Ministro da Economia já é suspeita se for para além da nobre missão de retirar o estado da economia.

Claro que nas massas cinzentas de alguns partidos fortemente aparentados aos dinossauros não está prevista a possibilidade de existência de mundo para lá do partido. Mas outros há que prevêem a existência desse mundo como coisa absolutamente necessária para ser dirigida por eles.

Chiça. Parem de meter o nariz na vida alheia.

O estado encontra-se capturado por enxames de luminárias da coisa alheia. São organismos sobrepostos e conflituantes, organizações de organismos, observatórios de tudo e mais alguma coisa, regulamentadores inter-regulamentadores, paridores de legislação em infinitas teias de aranha de organismos estatais e executantes da regulamentação da "europa", enfim, uma infinitude de gente disposta a regulamentar desregulando a vida alheia no pressuposto que ela não só tudo aguenta como existe com o monocórdico destino de ser agraciada com a atenção dos regulamentadores. A isto chama-se corrupção. Pura corrupção. Corrupção no sentido de corrosão da racionalidade, da aceitação da autonomia das pessoas, da permissão à existência de liberdade individual. Parem de chatear. Porra. Chega.

Atrás desta corrupção vem a 'outra', igualmente competente. Os privados não aceitam os desígnios das luminárias? Desconfiam que a proposta não tem pés para andar? O estado garante que sim (pode lá acontecer alguma coisa ao arrepio das mentes iluminadas) e que feito de determinada forma tudo dará certo. Para mostrar quão magnânime é a sua sapiência passa à prática assinando papelada que cola o contribuinte à facturação dessa empresa. Com a bota entretanto já rota há que encontrar uma solução que "responda às necessidades" e "evoluções" e que congeminar mais uns projectos que, finalmente, irão "complementar", "potenciar" e "revelar" toda a "bondade" da sapiência.

Buracão atrás de buracão aparece a renegociação que, pela mão dos mesmos artistas, resulta no buraco negro onde todos nos encontramos e cujas muitas portas levam ao mesmo buraco negro.

O estado que se reduza à sua insignificância, que faça bem o que todos concordam que faça (justiça, segurança e defesa, talvez segurança-social) e deixe directamente nas mãos dos portugueses, progressivamente e em ambiente de concorrência, os restantes sectores que hoje abocanha ou em que interfere.

5 comentários:

Anónimo disse...

O Manuel Graça escreve um texto muito interessante. Mas nunca em Portugal o Estado se reduzirá a uma insignificancia qualquer. Porque a essencia da verdadeira ditadura de panelinhas politico-sociais que de há muito aqui existe consiste em estar protegida, e dependente, pelo e do Estado. Mas não por ser Estado (aqui a Anarquia nada resolveria, seria uma bagunça mais, aqui a Santa Anarquia tem o rosto da bagunça e da arbitrariedade disfarçada de "ditadorzecos individualistas") e sim porque a organização social lusa criada pelos séculos visa sempre a opressão e o arbítrio. É isso que explica que Cavaco não passe dum moralistóide de cozinha, paralelo ao contribuinte de páteo em que o mesmo Estado transformou o cidadão vulgar.

Elísio Arruda

alf disse...

é um ponto de vista; mas façamos agora um exercício de contraditório

Existem povos que não precisam de estado - os judeus e os ciganos, por exemplo. Claro que a sua continuidade exige certas regras, como só se poderem casar entre eles.

Estamos aqui a comunicar via net porque os alemães e mais alguns fizeram um instituto, que tinha há uns anos 10 000 engenheiros e cientistas, agora deve ter mais, que desenvolveu a tecnologia que permite a transmissão de dados necessária a todas as comunicações actuais - algo que só um estado pode fazer.

os grandes desenvolvimentos tecnológicos foram sempre patrocinados pelos governos. Desde sempre que são as políticas pro-activas dos governos que geram as grandes áreas de actividade, que dão origem às grandes empresas.

As indústrias militares e aeroespacial foram os grandes motores do sec XX, bem como os grandes laboratórios de desenvolvimento criados pelos governos. A bomba atómica não foi fruto da iniciativa individual, não é verdade?

O vinho do Porto, de que tanto nos orgulhamos, foi uma iniciativa do governo inglês, que quis fugir à importação do vinho francês e mandou uns quantos lordes cultivar vinha no Douro.

A grandeza de Inglaterra foi sempre o resultado de um estado forte, como acontece em todo o lado, mesmo Portugal teve o seu momento de grandeza quando teve um governo forte; e descambou na miséria que se conhece desde há séculos porque desde há séculos que só tem governos pequeninos e mesquinhos, sem projecto para o país, um país onde cada um se habituou a pensar só em si, fruto da ausência de um estado forte que sirva de bandeira.

É por isso que somos os reis dos desconfiados e o país onde mais cresce a desigualdade. Ora aqui está a explicação para este mistério que tanto me tem intrigado: porque é que somos tão "pequeninos" de cabeça? porque há séculos que só temos governos pequeninos, sem projecto para o país, sem políticas pro-activas, e isso tornou-nos num povo de meros "sobreviventes".

Joaquim Simões disse...

Alf:

Julgo que nem sempre, mas que frequentemente é isso que tem acontecido. Mas continue, que é para a gente poder assentar melhor a discussão da coisa.

RioD'oiro disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Manuel Graça disse...

Alf:

"os grandes desenvolvimentos tecnológicos foram sempre patrocinados pelos governos"

Em último caso porque saem de universidades estatais e, mesmo assim, no caso dos EUA, privadas. Mas que o desenvolvimento seja feito, por exemplo em universidades não é errado, embora possa ser pago a empresas desde que em concorrência. O problema é que entre nós o estado toma o freio nos dentes, patrocina o desenvolvimento e a fabricação em larga escala à custa do contribuinte. As eólicas, as auto-estradas, as obras megalómanas como estádios de futebol que estão às moscas, são um excelente exemplo.

De resto, todos os exemplos que dá vêm ao encontro do que afirmo.