Um Poema de Maria Estela
Guedes:
Eis a Terra
Sento-me na varanda
quando são de seda
as tardes de verão.
A cadeira balouçante na brisa,
perdidos os olhos, a memória e os sentidos
no perfil azul-sombrio da Serra do Marão.
Contudo,
terra minha mais do que Maranus
e Britiande, em Lamego,
é Gaia, a biosfera,
lápis-lazúli de ânsia
em que vogam, gigantes,
as Victoria
regia das estrelas.
E mais terra
ainda do que essas
é a secura desta falta de sementes
amara duna
o nada florir a nascente
além da vinha e dos pomares
como reconhecida cultura.
Vai morrendo lentamente a esperança
e sei que somos nós o parasita
terra que à terra volveremos
sem o prémio de um novo ab initio.
Numa qualquer
tarde sem ar limpo
nem límpida transfusão da luz
pela vidraça de fumo da atmosfera
mergulharemos no nada como o precipício
em que se aterra sob o seu próprio peso
o céu outrora anil-olímpico
agora xaile negro da saudade.
Do pó ao pó – eis a Terra.
(Membro da
Associação Portuguesa de Escritores, da Sociedade Portuguesa de Autores, do
Centro Interdisciplinar da Universidade de Lisboa e do Instituto São Tomás de
Aquino. Directora do TriploV
Entre outros, os livros: “Herberto Helder,
Poeta Obscuro”. Moraes Editores, Lisboa, 1979; “À Sombra de Orpheu”. Guimarães
Editores e Associação Portuguesa de Escritores, Lisboa, 1990; “Tríptico a
solo”. São Paulo, Editora Escrituras, 2007; “Chão de papel”. Apenas Livros
Editora, Lisboa. 2009; «A obra ao rubro de Herberto Helder», São Paulo, Editora
Escrituras, 2010).
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